quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Natal do menino abandonado




Pe. Alfredo J. Gonçalves
Assessor das Pastorais Sociais

Eu o vi nos grandes centros comerciais, os shopping-centers,
deitado num simulacro de manjedoura, no interior de uma gruta,
rodeado de Maria, José, os pastores, os reis magos e alguns animais;
mas as atenções das pessoas concentravam-se sobre outra figura:
vestida de cores fortes, barbas longas e brancas, sentado num trono,
distribuía sorrisos e carinhos, abraços e presentes às crianças;
o verdadeiro protagonista da festa, acanhado a um canto,
permanecia solitário e ignorado pela imensa maioria,
a exemplo de tantos meninos e meninas abandonados pela cidade. 

Eu o vi em algumas ruas ou praças da grande metrópole,
ao lado de estátuas de pessoas e animais acima do tamanho normal:
construções artísticas, criativas, profusamente iluminadas e enfeitadas,
os personagens bíblicos fazendo companhia ao menino no seu berço de palha;
mas os transeuntes não dispunham de muito tempo para contemplar a cena,
a ansiedade denunciava o frenesi e a voracidade dos encontros e das compras,
como se todos estivesses embriagados pelo brilho das luzes e presentes;
o protagonista maior desaparecia na torrente da multidão agitada,
como milhares de crianças em busca de abrigo, comida e carinho,
sós, órfãs e perdidas nos becos sem saída do álcool, violência ou droga.

Eu o vi no interior de muitas casas, onde a tradição cristã exige o presépio:
o mesmo menino, as mesmas figuras, os mesmos animais, o mesmo arranjo,
com o acréscimo progressivo da árvore, do Papai Noel e de vários enfeites;
a família, porém, tinha mil outros afazeres, próprios do final de ano,
não podendo perder tempo com reflexões sobre semelhante cenário;
roupas e sapatos, eletrônicos e eletrodomésticos, novidades de todo tipo,
exigiam muita pesquisa, variados preparativos e uma série de esforços;
pouca ou nenhuma atenção merecia a imagem do recém nascido,
como milhões de meninos e meninas marcados pelo abandono e a miséria.

Eu o vi nas Igrejas, não raro em arquiteturas caras e sofisticadas,
com a sagrada família e as tradicionais figuras ao redor dela
movimentando-se através de mecanismos e engrenagens invisíveis;
as cores e a indumentária das autoridades eclesiásticas, porém,
por vezes ofuscavam a simplicidade, a nudez e a humildade do menino;
outras vezes um liturgismo rígido e ritualista, primando pela formalidade,
afastava os fiéis do contato vivo com a Boa Nova da Encarnação;
como aos saduceus e fariseus de todos os tempos,
a miopia e a cegueira impediam de sentir a aurora do amor divino, incondicional e revestido de perdão, misericórdia e compaixão,
como também de inúmeros meninos que já nascem condenados à morte.
Amor personificado na singela imagem do presépio e do recém nascido.

domingo, 16 de dezembro de 2012

As CEBs frente aos desafios do mundo contemporâneo





Quarto Seminário CEBs Nacional – abrangendo Sulão e Lestão – para trinta pessoas

As CEBs frente aos desafios do mundo contemporâneo
São Paulo, SP - 08 a 11 de dezembro de 2011
Organizações responsáveis:
            Setor CEBs / Comissão para o Laicato da CNBB
            Iser Assessoria

Local: Centro de Formação Sagrada Família  -
Ipiranga – São Paulo   - (Local onde há o Museu  Santa Madre Paulina – SP – onde ela fundou e morou)                  

Assessoria de:
Pe. Oscar Beozzo         
 Sérgio Coutinho                  
Solange Rodrigues
Pe. Alfredo J. Gonçalves         
Ivo Lesbaupin
Fernando Altemeyer Junior       
Pe. Benedito Ferraro     
Francisco Orofino

                                  Temas desenvolvidos:
- As CEBs: do Concílio Vaticano II a Aparecida e no Magistério da Igreja do Brasil
- Quais são os desafios do mundo contemporâneo para as CEBs?
- As CEBs: do Concílio Vaticano II a Aparecida e no Magistério da Igreja do Brasil
- Quais são os desafios do mundo contemporâneo para as CEBs?
- As CEBs diante dos desafios do mundo contemporâneo I (ênfase na dimensão sóciopolítica)
 Cine debate
 - As CEBs diante dos desafios do mundo contemporâneo II (ênfase na dimensão cultural e religiosa)
- O papel da assessoria nas CEBs
- Cine Debate                                  

 * lançamento de livro de Leonardo Boff em SP

CEBs - Diocese de Itapipoca

Hoje, 15 de dezembro, simultaneamente nas paróquias São Sebastião, Apuiarés e Nossa Senhora de Fátima, Itarema o encontro de CEBs. Em Apuiarés,  se reunem as paróquias Nossa Senhora do Rosário (General Sampaio), São Francisco de Assis (Pentecoste), Nossa Senhora da Conceição (Pentecoste), São Pedro (Tejuçuoca), São Sebastião (Apuiarés). Já em Itarema,  reunem as paróquias Nossa Senhora da Conceição (Amontada), Nossa Senhora da Conceição (Almofala), São Pedro (Miraíma), Nossa Senhora de Fátima (Itarema) e Área Pastoral Santa Rita de Cássia (Juritianha).
A caminhada dos Conselhos de Comunidades, o papel e a formação dos animadores das comunidades é um ponto em debate em ambos os encontros. Cada conselho de comunidade foi convidado a enviar  duas pessoas ao encontro, e a coordenação solicitaram  aos participantes que levarem o livro “Povo de Deus que se organiza” e a Bíblia. Com início às 7h e término ao 12h, em ambos os encontros.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

"Profecia de 2012 será sobre crise de consciência"



O tempo de Fernand Malkun é dividido entre a investigação e conferências. O especialista em cultura maia explica o que esta civilização descreveu para o ano 2012.

Há quinze anos, Fernando Malkun, barranquillero (natural de Barranquilla, uma cidade da Colômbia) de origem libanesa, deixou a arquitetura que tinha estudado na Universidade de Los Andes, e à qual havia se dedicado por quase uma década, para responder às perguntas que se atravessaram em sua vida. Durante esse tempo, ele se encontrou com a cultura Maia e dedicou-se completamente ao seu estudo. Hoje é um especialista no tema, com reconhecimento internacional e continua viajando pelo mundo explicando a mensagem que esta civilização deixou para os seres humanos.

Os maias disseram que o mundo iria acabar em 2012?
Estão gerando um pânico coletivo absurdo aduzindo que eles tinham anunciado que o mundo iria acabar em dezembro de 2012. Não é verdade. Os Maias nunca usaram a palavra fim. Anunciaram, isto sim, um momento de mudança, de grande aumento de energia do planeta, o que causaria "eventos de destino", isto é, definitivos, nas pessoas. O problema é que o nível de consciência da maioria das pessoas atinge apenas o fim do mundo e não a transformação de consciência.

Quando isso vai acontecer?
Não vai acontecer, está acontecendo. As pessoas não estão juntando todas as peças do quebra-cabeças para perceber isso. Acreditam apenas que estes eventos atuais são causados por um conjunto de "coincidências" evolutivas. Mas estamos em uma onda de mudanças como nunca antes.

O que se percebe, segundo o que é dito pelos Maias?
A profecia anunciou que o planeta aumentaria a sua frequência vibracional, o que é um fato: esta frequência, que se mede com a ressonância Schumann, passou de 8 a 13 ciclos. Todos os planetas do sistema solar estão mudando. De 1992 até hoje, os polos de Marte desapareceram 60 por cento e Vênus tem quase o dobro de luminescência. Passamos 300 anos registrando o Sol e as tempestades solares maiores têm ocorrido nos últimos seis meses. Houve um aumento de terremotos de 425 por cento. Tudo está acelerado dos pontos de vista geofísico e solar. Nosso cérebro, que irradia suas próprias ondas, é afetado por essa maior irradiação do sol. Essa carga eletromagnética é o motivo por que sentimos o tempo mais rápido. Não é o tempo físico, mas o tempo de percepção emocional.

Fale sobre 1992. Por que este ano? O que aconteceu?
A essência das profecias maias é comunicar a existência de um ciclo de 26.000 anos, chamado "o grande ciclo cósmico". Tudo, estações, meses, dias se ajustam a esse ciclo. Há 13 mil anos, o sol – assim como agora – irradiou mais energia no planeta e derreteu a camada de gelo. Essa camada desaguou no mar, elevou o seu nível em 120 metros e ocorreu o chamado "Dilúvio Universal". Os Maias disseram que quando o sistema solar estiver novamente a 180 graus de onde estava há 13.000 anos, a Estrela do Norte brilhar sobre o polo, a constelação de Aquário aparecer no horizonte e o trânsito décimo terceiro de Vênus se der – o que vai acontecer em 6 de junho de 2012 – o centro da galáxia pulsará e haverá manifestações de fogo, água, terra, ar. Eles falam, especificamente, de dois períodos de vinte anos – de 1992 a 2012 e de 2012 a 2032 – de intensas mudanças.

Por que anunciavam isso?                                                                                                           
A proximidade da morte faz com que as pessoas repensem suas vidas, examinem e corrijam a direção que tomam. Isso é algo que ocorre somente se algo se aproxima de você, ou você passa diretamente, te impacta tremendamente. Isto é o que tem acontecido com os tsunamis, os terremotos, as catástrofes naturais que vivemos, os conflitos sociais, econômicos, etc.

Então, eles falam de morte.
Eles falam de uma mudança, de um despertar da consciência. Tudo o que está errado com o planeta está se potencializando com o objetivo de que a mente humana se dedique a resolvê-lo. Há uma crise de consciência individual. As pessoas estão vivendo "eventos de destino", seja em seus relacionamentos, em seus recursos, em sua saúde. É um processo de mudança que se baseia principalmente no desdobramento invisível, e está afetando em especial à mulher.

Por que as mulheres?
A mulher é quem terá o poder de criar a nova era, devido à sua maior sensibilidade. De acordo com as profecias – não só as maias, mas muitas – a era que se aproxima é de harmonia e espiritualidade. As coisas que estão mal vão se resolver no período que os Maias chamaram de "tempo do não tempo", que será de 2012-2032. Desde 1992, o percentual de mulheres que veem a aura (seres curadores) no planeta tem aumentado. Hoje, é de 8,6 por cento. Imagine que em 2014 seja de 10 por cento. Isso significaria o início de um período mais transparente. Essa seria a direção da mudança não violenta.

Mas o que se vê hoje é um aumento na agressividade...
As duas polaridades são intensificadas. Estão abertos os dois caminhos, o negativo, escuro, destruição, de confronto do homem com o homem; e o de crescimento da consciência. Existem várias vozes que estão levando os seres humanos a pensar sobre isso. Desde 1992, as informações proibidas dos gnósticos, dos maçons, dos Illuminati, estão abertas para que se utilize no processo de mudança de si mesmo. A religião esta acabando e a religiosidade é que irá permanecer.

Tudo isso, os Maias deixaram de escrito, assim específico?
Não a esse ponto. Eles disseram que o sol iria mudar as condições do planeta e criar "eventos de destino". O sol bateu todos os recordes este ano. Os terremotos aumentaram 425 por cento. A mudança de temperatura é muito intensa: de 92 para cá aumentou quase um grau, o mesmo que subiu nos últimos 100 anos anteriores. Antes, havia 600 ou 700 tormentas elétricas simultâneas, hoje há duas mil. Antes se registravam 80 raios por segundo, agora caem entre 180 e 220.

Como eles sabiam que isso ia acontecer?
Eles tinham uma tecnologia extraordinária. Em suas pirâmides havia altares de onde eles estudavam o movimento do sol no horizonte. Produziam gráficos com os quais sabiam quando haveria as manchas solares, quando aconteceriam tempestades elétricas. Foi um conhecimento que receberam dos egípcios, que, por sua vez, o receberam dos sacerdotes sobreviventes da Atlântida, civilização destruída 13.000 anos atrás. Os Maias aperfeiçoaram o conhecimento e foram os criadores dos calendários mais precisos. Um deles, chamado "a conta larga" termina em 21 de dezembro de 2012, e marca o ponto do centro exato do período de 26.000 anos. Eles sabiam que essas mudanças estavam vindo e o que eles fizeram foi dar essa informação para o homem de 2012.

Será que estas mudanças só foram levantadas por eles?
Todas as profecias falam da mesma coisa. Os hindus, por exemplo, anunciam o momento de mudança e falam sobre a chegada de um ser extraordinário qual o mundo ocidental cristão apregoa. Os Maias nunca falaram de um ser extraordinário que viria para nos salvar, mas falaram de crescer em consciência e assumir a responsabilidade, cada ser na sua individualidade.

E se as pessoas não acreditam nisso?
Acreditando ou não, vai senti-lo no seu interior. A mudança que estamos vivenciando não é algo de se acreditar ou não. Neste momento, a maioria está vivendo um tempo de avaliação de sua vida. Por que estou aqui, o que está acontecendo, para onde eu quero ir? Basta olhar o crescimento da busca de espiritualidade, não de religiosidade, porque a religião não está dando mais respostas às pessoas.

A sua vida pessoal mudou?
Quinze anos atrás, eu era tremendamente materialista. Minha conduta é muito diferente hoje. Eu me perguntei por que estava aqui, para quê, e por razões especiais acabei metido no mundo Maia. E posso afirmar que não se tratam de crenças falsas para substituir crenças falsas. Tirei muitas histórias da minha mente, mas ainda estou no terceiro nível de consciência, que é dominante no planeta.

Quem está mais em cima?
Há pessoas que estão em um nível 4 ou 5. São as menos famosas, de perfil baixo. Em uma viagem conheci um jardineiro extraordinário, por exemplo. Estes seres estão em serviço permanente, afetando a vida de muitas pessoas, mas não publicamente.

O que devemos fazer, de acordo com essa teoria?
O universo está nos dando uma oportunidade individual para reestruturar nossas vidas. A maneira de sincronizar-nos é, primeiro, não ter medo, perceber que podemos mudar nossa consciência. A física quântica já disse: a consciência modifica a matéria. O que significa que sua vida depende daquilo que você pensa. A distância entre causa e efeito tem diminuído. Vinte anos atrás, para que se manifestasse algo em sua vida, necessitava-se de muita energia. Vinte anos atrás, qualquer fator de punição de um ato maldoso levava anos para receber alarde. Hoje tudo ganha destaque rápido. A corrupção pelo mundo afora tem ganhado relevo internacional. As ditaduras estão caindo. As religiões estão cada dia mais problemáticas. Hoje, você pensa algo e em uma semana está acontecendo. Sua mente causa isso. O que devemos é buscar, as respostas estão aí.
Basta ter olhos para ver e ouvidos para ouvir.

Fonte: Eltiempo

Caminhar com os pobres para construir uma teologia viva

 “Para mim é um absurdo falar em autocrítica a respeito da relação entre Teologia da Libertação e marxismo”, afirma Jon Sobrino

Ao refletir sobre os rumos da Teologia da Libertação nos últimos 40 anos, o teólogo espanhol Jon Sobrino reconhece que ela pode ter perdido um pouco da força e da potência midiática que possuía nos anos 1980. Ele recorda a época dos regimes militares na América Latina, que teria sido o período de maior perseguição aos teólogos da libertação: “as ditaduras militares usavam força militar, ou seja, armas, com as quais podiam matar e assim o fizeram. Agora o que temos são democracias capitalistas. E que poder elas têm? O capital. Este não mata normalmente, porque pode enganar ou comprar as pessoas de outras formas. A Teologia da Libertação pode realmente ter perdido forças. O que não perde as forças é o capital”. Para Sobrino, “o capitalismo pode tolerar até certo ponto a ajuda e o amor aos pobres. Outra coisa é quando se sai em defesa deles, o que provoca um conflito social. Nesse sentido, o povo pobre ensina a nós, que não somos pobres, a ver melhor as coisas do mundo real, porque vivem uma realidade que não vivemos. Em geral, os pobres não querem servir de exemplo para ninguém. Eles simplesmente dão o exemplo pela experiência, pelo modo de ser e nos evangelizam”.

Jon Sobrino é professor da Universidade Centro-Americana – UCA, de San Salvador. Doutor em Teologia pela Hochschule Sankt Georgen, em Frankfurt (Alemanha) e diretor da Revista Latino-americana de Teologia e do informativo Cartas a las Iglesias, é autor de, entre muitos outros livros, Cristologia a partir da América Latina: esboço a partir do seguimento do Jesus histórico (Petrópolis: Vozes, 1983). Sobrino esteve na Unisinos participando do Congresso Continental de Teologia, com a conferência inaugural do evento, intitulada “Um novo Congresso e um Congresso novo”, no último mês de outubro, ocasião em que concedeu a entrevista a seguir, pessoalmente, à IHU On-Line.

Confira a entrevista.
IHU On-Line – Quais os caminhos para se construir uma teologia viva?
Jon Sobrino – Há um poema de um poeta espanhol chamado Antonio Machado , cantado por Joan Manuel Serrat , cantor popular espanhol, que diz “Caminhante, não há caminho; o caminho se faz ao andar” . Você me pergunta quais os caminhos para construir uma teologia viva. E eu te respondo com a canção: não há caminhos; eles se fazem ao andar. Se vivemos no mundo com os olhos abertos para ver a pobreza real, percebemos que ela se capta melhor com o nariz, com o cheiro das pessoas. Às vezes, quando vemos os pobres nas fotografias, eles são até bonitos: estão nus, sujos, até simpáticos. Mas quando nos deparamos com os pobres e queremos humildemente ajudar, estamos fazendo o caminho para uma teologia viva. Constrói-se uma teologia viva caminhando com os pobres. Casaldáliga , que é outro grande poeta, comentando a referida poesia de Antonio Machado, diz: “o caminho se faz ao andar para que os atrasados possam nos alcançar. É preciso caminhar para animar aqueles que estão atrás, para que também caminhem. Faça do canto do teu povo o ritmo da tua marcha”.
IHU On-Line – Quarenta anos depois do surgimento da Teologia da Libertação, que autocrítica ela deve fazer?
Jon Sobrino – A primeira autocrítica é reconhecer que é humana. E não falo aqui da Teologia da Libertação, mas de teólogos, teólogas, homens, mulheres, sacerdotes, leigos e jornalistas também. Falo de pessoas. Há jornais e periódicos da libertação, mas há também os da opressão. O que vejo é que há resistência à Teologia da Libertação por parte do Vaticano, que a persegue. Talvez, às vezes, com razão, afinal, ela não é perfeita; mas muitas vezes sem razão. Alguns teólogos, como Ignacio Ellacuría , foram mortos não por serem teólogos da libertação, mas por defenderem o pobre, por lutarem pela justiça e trabalharem pela paz. A direita dos militares não queria ouvir falar de uma paz entre marxistas e ricos. Também destaco que a Teologia da Libertação começou como um movimento realizado por homens e devemos nos perguntar o que temos feito com as mulheres enquanto intelectuais pensantes e teólogas? E nesse campo é preciso fazer uma autocrítica. No entanto, as coisas estão caminhando. O mesmo ocorre em relação aos indígenas. Para mim é um absurdo falar em autocrítica a respeito da relação entre Teologia da Libertação e marxismo.
IHU On-Line – Muitos criticam a Teologia da Libertação, dizendo que ela perdeu o entusiasmo e a força de atuação dos anos 1980. Como recebe essa crítica e quais os desafios da Teologia da Libertação hoje? 
Jon Sobrino – Em primeiro lugar, a Teologia da Libertação é um ente abstrato. Ellacuría também perdeu a força quando estava vivo, porque o mataram. Mas mantém sua força mesmo morto, como teólogo, por meio de seus escritos, que hoje são muito mais lidos do que antes. Gustavo Gutierrez  perdeu força? Creio que não, pois aos 84 anos continua produzindo e está escrevendo um livro importante sobre os pobres, que acredito que será muito bom. Leonardo Boff  também não perdeu a força, mas mudou a direção de sua força. O que quero dizer é que os teólogos que seguiram Medellín  tem sofrido muita perseguição. Sempre que o pensar cristão estiver realmente baseado em uma visão dos pobres, em uma prática movida pela compaixão pelos pobres, haverá perseguição. No entanto, percebo que hoje há menos perseguição do que há alguns anos. Por exemplo, na UCA (Universidad Centroamericana José Simeón Cañas, em El Salvador), onde estou, de 1976 a 1989, foram explodidas no campus 25 bombas. Isso não ocorre mais hoje. É preciso reconhecer que a UCA perdeu muito da sua força social, realmente, afinal não temos mais um Ignacio Ellacuría ou um Martín-Baró, e todos aqueles que eram grandes lutadores sociais. Então, admito que a Teologia da Libertação não atua como nos anos 1980. Ela perdeu popularidade midiática, sem dúvida nenhuma.
IHU On-Line – Mas hoje não temos mais ditaduras militares; vivemos em uma democracia... 
Jon Sobrino – As ditaduras militares usavam força militar, ou seja, armas, com as quais podiam matar e assim o fizeram. Agora o que temos são democracias capitalistas. E que poder elas têm? O capital. Este não mata normalmente, porque pode enganar ou comprar as pessoas de outras formas. A Teologia da Libertação pode realmente ter perdido forças. O que não perde as forças é o capital. Por exemplo, a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos que serão realizados no Brasil irão ser eventos fantásticos e que não correm nenhum risco de fracasso, porque são expressões do capital. No entanto, uma universidade que pensa, uma igreja que predica, pode perder força no sentido de que os ricos dizem: “essas não incomodam mais”.
IHU On-Line – Hoje não temos mais grandes líderes como Ignacio Ellacuría, por exemplo?
Jon Sobrino – Não. E sei bem disso, pois convivi com ele durante 15 anos. Mas isso não significa perder força. Essa é a lei da vida. Quando há grandes líderes que são mortos, não se pode esperar que imediatamente surjam outros. Se vier será muito bom, mas nem sempre é o que ocorre. No entanto, não me assusto com o fato de que não há grandes líderes. O problema está quando se mata o povo; e aqui não falo apenas de matar com armas.
IHU On-Line – Em que sentido a vivência com o povo de El Salvador ensina a fazer uma teologia atenta aos sinais dos tempos?
Jon Sobrino – O que faço é uma teologia junto aos pobres, de alguém interessado pelos pobres e, sobretudo, foi designado a mim, em El Salvador, mais do que estar com os pobres, estar perto de pessoas perseguidas. Quando cheguei a El Salvador não tinha a mais remota ideia do que iria me acontecer, pois eu vinha dos meus estudos na Alemanha. Ao nos sentirmos tocados pela realidade, nos move a vontade de fazer algo de concreto por ela. Fiz minha tese de doutorado em Frankfurt sobre a cristologia, mas foi em El Salvador, no ano de 1970, que aprendi porque mataram Jesus de Nazaré, porque o crucificaram no ano 30 ou 33. Paulo foi morto decapitado com uma espada, o que era uma morte digna na cultura romana. A morte na cruz, além de ser uma crueldade terrível, era a morte designada aos terroristas. Era uma morte humilhante, até para a família de um crucificado. Mas por que fizeram isso com Jesus? Porque ele se envolveu – principalmente com palavras – no conflito social da época, defendendo o povo oprimido. A expressão “opção pelos pobres” é algo que gosto muito, mas não de forma absoluta, porque a opção pelos pobres não significa optar pelos pobres simplesmente, mas, primeiro, sair em defesa deles. É mais profundo. O capitalismo pode tolerar até certo ponto a ajuda e o amor aos pobres. Outra coisa é quando se sai em defesa deles, o que provoca um conflito social. Nesse sentido, o povo pobre ensina a nós, que não somos pobres, a ver melhor as coisas do mundo real, porque vive uma realidade que não vivemos. Em geral, os pobres não querem servir de exemplo para ninguém. Eles simplesmente dão o exemplo pela experiência, pelo modo de ser e nos evangelizam.

Graziela Wolfart


Fonte: IHU

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Comunidades Eclesiais de Base da Diocese de Macapá

Reunidos com o nosso Bispo Dom Pedro e nossos párocos, no vigésimo oitavo encontro diocesano das Comunidades Eclesiais de Base, em 25/11/12, nós cristãos e cristãs, chamados a ser testemunhas do Cristo Rei da paz e da verdade, queremos levar ao conhecimento de todos e de todas os clamores de sofrimento que saem da vida de nossas comunidades.
Milhares de famílias dos municípios de Vitória do Jarí, de Laranjal do Jarí e de Almeirim estão sofrendo pela próxima perda de seus empregos por causa da empresa Jarí Celulose que pretende suspender, por longo tempo, as atividades da fábrica de celulose. Circula, inclusive, a informação da venda da empresa para a International Paper que, em caso afirmativo, deveria ser chamada para dizer quais as suas intenções. Esta violência vai provocar efeitos negativos em quase todas as comunidades do lugar, atingindo também os milhares de empregos indiretos que estão ligados a este empreendimento. Grande é, também, a preocupação com as conseqüências sociais e ambientais da construção da barragem Santo Antônio.
As comunidades das Ilhas de Afuá e de Gurupá, assistidas pela nossa diocese, estão clamando pela violência que vem se alastrando na região, sem que o Estado faça o mínimo necessário para detê-la. São desmatamentos ilegais em projetos de assentamento, assassinatos, assaltos, tráfico de drogas e de pessoas, exploração sexual de menores que vêm se multiplicando nestas terras que parecem ser terras de ninguém. Criminosos e foragidos do Amapá se escondem com facilidade nesta região, provocando mais insegurança e muita dor. O Amapá não tem jurisdição, o Pará está longe demais e neste vácuo de poder, a criminalidade cresce.
Em seis município do Amapá, dezenas de famílias de posseiros estão sendo despejadas de suas terras por ações judiciais promovidas pela AMCEL, depois que a mesma passou a ser de propriedade das empresas japonesas Marubeni Corporation e Nippon Paper que desrespeitaram os acordos firmados com as comunidades pelas administrações anteriores e se valendo, em vários casos, de matrículas irregulares, quando não claramente ilegais. Muitas famílias estavam nas terras, antes delas serem da AMCEL.
As comunidades dos municípios de Pedra Branca do Amapari e de Serra do Navio estão sentindo a dor provocada pelas atividades e os interesses das mineradoras que, além das agressões ao meio ambiente, estão atrasando os repasses das compensações estabelecidas, deixando as comunidades desprotegidas, vítimas do aumento descontrolado da população e de todos os seus efeitos negativos na saúde, na educação e na segurança pública.
A mesma situação vive a população dos municípios de Ferreira Gomes e de Porto Grande, cujas comunidades já encaminharam aos órgãos públicos um abaixo assinado manifestando sua preocupação por causa da construção das várias barragens previstas no Rio Araguari. As comunidades do Baixo Araguari estão sofrendo por causa de uma descontrolada criação de búfalos que está provocando o assoreamento do rio e a salinização de vastas áreas.
As comunidades de Oiapoque sofrem os efeitos negativos provocados pelo tráfico internacional de pessoas, de drogas e de armas. A violência e a insegurança reinam na cidade e nas comunidades próximas.
As comunidades das cidades de Macapá e de Santana clamam por causa do crescente desemprego, pela precariedade na saúde e pelo abandono de grandes áreas das periferias e das baixadas, onde as famílias vivem na insegurança e no medo que prejudica a vida das pessoas e até as atividades religiosas das comunidades.
Em nome de Cristo, único e verdadeiro Rei da paz e da justiça, nós Comunidades Eclesiais de Base da Diocese de Macapá, afirmamos nossa solidariedade fraterna às vítimas desta violência e nos comprometemos a denunciar e a lutar com coragem e firmeza, contra todas as formas de injustiça, sobretudo, contra a inoperância, a omissão e, em alguns casos, até a conivência dos poderes públicos. Que o exemplo do profeta Elias, que meditamos neste encontro, nos inspire e fortaleça.
Que o Espírito Santo difunda sobre nós os seus dons para que possamos dar conta deste compromisso.
Os participantes do 28º encontro diocesano das Comunidades Eclesiais de Base.

CEBs - Diocese de Picos

Representantes das Comunidades de Eclesiais de Base das paróquias que formam a Diocese de Picos estiveram reunidos entre os dias 24 e 25 de novembro no Centro de Treinamento Diocesano-CTD durante a Assembleia Diocesana de CEBs.

O evento foi assessorado pela professora Aurenir Paiva, que realizou um aprofundamento sobre “Justiça e Profecia em defesa da vida no Nordeste”, que também foi tema do Nordestão de CEBs, realizado em Itabuna-BA entre os dias 19 a 22 de julho de 2012.

A assembleia contou com a presença de dom Plínio José, Bispo Diocesano de Picos, do Pe. Francisco Pereira Borges, Pároco de Bocaina, além de 20 participantes, entre leigos e religiosas.

As propostas que surgiram durante a assembleia serão compiladas pela Coordenação Diocesana de CEBs no dia 20 de dezembro, em seguida enviadas  para todas paróquias.                                                                                                                                                  

Entre elas, está a sugestão de colocar dentro das assembleias paroquiais de pastoral a proposta de refletir sobre o tema do 13º Intereclesial de CEB’s, que será realizado de 07 a 11 de janeiro de 2014 em Juazeiro do Norte-CE.

Além disso, a articulação e mobilização nas paróquias, bem como, a realização de um curso para todos aqueles que estarão participando do Intereclesial.

CEBs Diocese da Santissima Conceição do Araguaia

A coordenação das CEBs prepara, organiza e articula todos os encontros diocesanos, trabalhando a união entre todas as coordenações da Diocese. A coordenação também tem como missão representar a Diocese nos encontros do Regional Norte II.
Para além dos encontros com as comunidades, as CEBs organizam quatro encontros por ano com os representantes de cada paróquia, com o nome de Ampliada. Na última Ampliada do ano é feita uma avaliação do ano corrente e um planejamento para o ano seguinte.
Coordenadores: Afonso Campos (Redenção, Paróquia Cristo Redentor), Maria do Perpétuo Socorro Duarte (Redenção, Paróquia N.SRA das Graças) e Francisca Aparecida Silva Santos (Rio Maria)
Assessor: Pe. Ladir (São Geraldo do Araguaia, Paróquia São Batista)
Secretariado: Aureni (Xinguara, Paróquia São José Carpinteiro), Meirivan (Rio Maria)

Na prática, a teologia (da libertação) é outra!

Desde o seu início, a Teologia da Libertação latino-americana assumiu que a sua especificidade ou originalidade não consistia em falar em favor dos pobres ou criticar o capitalismo. Pois, diversas teologias já tinham feito isso antes e estavam fazendo na época do surgimento da TL na América Latina. Entre as diversas características do que se chamou de "ruptura epistemológica” da TL, estava a relação dialética entre a teoria e práxis. Eu usei o termo "estava” porque sinto que muitos dos textos produzidos hoje do que ainda se entende como teologia da libertação não leva mais isso a sério.
Parafraseando livremente uma das afirmações de Marx sobre Feuerbach, que foi muito importante nessa ruptura epistemológica, podemos dizer: os teólogos já tem demasiadamente interpretado e até condenado o mundo moderno e o capitalismo, mas é preciso ir além e transformá-lo.
Quando se fala na transformação é preciso entender que não é um simplesmente prolongamento, um passo a mais, da interpretação e condenação. O momento prático de lutas de transformação é um momento qualitativamente diferente da crítica meramente teórica. Tomemos um exemplo para deixar essa ideia mais clara. Um teólogo pode criticar o capitalismo dizendo que o sistema de mercado, com sua concorrência e obsessão por eficiência econômica, é injusta e opressora. Mas, se não dá o passo seguinte de pensar e construir um sistema alternativo ou práticas econômicas mais justas, esse mesmo crítico não vai perceber que a práxis transformadora exige que as ideias críticas se "encarnem” dentro das realidades econômicas e sociais existentes e partir dos recursos materiais, humanos e de conhecimento existente criar algo alternativo. Isto é, exige que saia da postura de condenação abstrata e veja o que é possível fazer com e a partir do que temos hoje.
Na medida em que se defronta com as condições objetivas da realidade existente, teólogo/a precisa rever até mesmo a sua interpretação e condenação feitas antes da ação. Pois percebe que a crítica abstrata acaba por exigir e promete objetivos que não são viáveis, factíveis, no momento ou mesmo dentro das condições humana e histórica. É a práxis que nos dá consciência dos limites que enfrentamos.
Diante desses limites, há duas posições básicas. Uma é manter sua autoimagem de crítico radical e, na prática, abdicar fazer algo concreto ficando somente na postura de condenação. Outra é estabelecer uma relação dialética entre teologia e práxis e perceber que a crítica teológica possibilitou ver as injustiças do mundo e o horizonte de um mundo alternativo; e ao assumir lutas concretas, aprender da práxis a rever posições teológicas e de teorias sociais para que possamos construir alternativas concretas. Assim, por exemplo, reconhecer que não é possível organizar uma economia global alternativa sem nenhum mecanismo de mercado.
É claro que para o primeiro grupo, os críticos pseudorradicais, a relação dialética entre teologia e práxis aparece como reformismo inaceitável, como um tipo de conivência com o sistema. O segundo grupo, diferentemente, aprende que "na prática, a teologia (da libertação) é outra”. Aprende que críticas ou condenações abstratas, sem articulação com lutas de criação de alternativas concretas, podem ser suficientes para pessoas que vivem (ganham a vida) com discursos ou cursos, mas insuficientes para a criação de um outro mundo.
A Teologia da Libertação não nasceu para propagar imaginações radicais que servem de base para condenação abstrata do mundo existente, mas sim para refletir criticamente a teologia e fé cristã, questionando e respondendo questões que nascem da luta concreta pela construção de uma sociedade mais justa e humana.

 Jung Mo Sung

Fonte: Adital

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Mística





A palavra “mística” tem múltiplas conotações. Pode significar espiritualidade, reza, esoterismo, experiência de Deus e prática religiosa. 

Os companheiros do MST, por exemplo, no contexto de uma ocupação de terra, fazem uma “mística”, um culto ecumênico cujos símbolos e palavras antecipam o êxito desejado do evento. 

Também os povos indígenas, quando preparam uma luta importante, pintam seus corpos, fazem danças e invocam seus espíritos para favorecer o empreendimento. 

A mística dos oprimidos, geralmente, é uma vivência comunitária de coragem, o fortalecimento de uma responsabilidade em rede, uma prática religiosa que lembra uma vitória do passado e antecipa uma transformação que permite o infinito se fazer presente na concretude da vida, nos trabalhos corriqueiros e nas lutas pela causa. 

Nossa mística não é uma mística de olhos fechados, mas um caminho espiritual para crescer e transformar-se na vida cotidiana. 

As pessoas deste caminho são companheiros e companheiras nossos com os quais não só repartimos o pão, mas abrimos mão de tudo. 

Tudo que queremos segurar, pode se tornar veneno. Deus ama as mãos vazias. Abrir mão de conquistas e certezas de ontem, pode ser um portal para a vida de hoje. Transformar significa sempre abrir mão de algo. E a vida se dá somente na transformação e na passagem.

A mística missionária militante é a mística do Reino, vigília pascal, essência da Vida na existência histórica, atravessada por desejos humanos; presença do espírito na ação e no caminho. Nossa mística está enraizada na fé. 

Acreditamos no projeto de Jesus e na presença de Deus na realidade do mundo em construção. Ao revelar o incógnito de Deus no mundo, como os hóspedes na tenda de Abraão (Gn 18) e o forasteiro de Emaús (Lc 24,13ss), os povos indígenas e os pobres são sinais de Deus no tempo. 

Questionam a vida sedentária e as simulações de agitação, avisando que o conforto da “gaiola dourada” e o tratamento do tempo como se fosse dinheiro, não compensam o sofrimento que causam. 

A mística nos permite viver a memória e a utopia de um mundo para todos, livres e iguais, iguais em direitos e deveres, mas com caminhadas históricas diferentes. 

Na caminhada se cruzam muitos caminhos. Não existe a hegemonia do caminho único ou da leitura definitiva da realidade. Ninguém tem a última palavra. Novas misturas, pontos de vista diferentes e enfoques inusitados lembram a possibilidade de outros caminhos. A verdade do caminho é uma opção histórica, não uma necessidade.

A utopia do Reino está presente em atitudes e relações, não em sistemas, instituições ou partidos. Tomamos partido, mas não somos partido.

 Fizemos a opção pelos povos indígenas e definimos prioridades, mas não somos um partido indigenista. Por sua própria natureza, os partidos criam divisão e produzem uma acomodação burocrática. 

No caminho do Reino, os partidos têm, como as próprias Igrejas, um caráter transitório. A aproximação da utopia, como nova criação, está vinculada a uma diminuição institucional.

A globalização, com sua visibilidade e rapidez, simulando baixo custo e prazer imediato no interior de estruturas concorrenciais, colocou a mística da missão em desvantagem.

A mística tem pouca visibilidade, porque não cabe na mídia. 

As tentativas miméticas de algumas Igrejas, recorrendo ao showbusiness da fé, são espiritualmente superficiais, teologicamente sectárias e fundamentalistas, e eticamente vazias. 

Legitimam a violência em curso, porque escondem a cruz de Cristo e os rostos dos crucificados. Procuram reencantar a vida com deuses e diabos, infantilizando os fieis. 

Nisso são complementares, de uma maneira grosseira, à atual estetização da violência, da pobreza e da sexualidade nos cinemas. Certas cenas do filme „A paixão de Cristo“, de Mel Gibson, lembram pinturas de Matthias Gruenewald (1470-1528) num salão de tortura.

O mercado financeiro não pode ser vencido pelo mercado religioso, mas pela gratuidade da cruz. Entre vencedores e vencidos, seja no mercado ou no campo de futebol, existe uma relação mimética. 

A atitude mimética é tendencialmente violenta, porque exige um sacrifício recíproco para manter a diferença (para ser melhor que o outro) ou faz da própria eliminação da diferença o sacrifício mediante a identificação, a incorporação, a imitação ou eliminação do outro. 

Nós cristãos, peregrinos das Américas e do mundo, contemplamos nos crucificados da história nosso irmão e mestre, fundador crucificado e ressuscitado. 

Num ato de justiça definitiva, Deus rompeu com os sacrifícios humanos. Jesus de Nazaré, morto na cruz, liberta da necessidades de outros sacrifícios redentores. 

Redenção e libertação não estão mais sob a pressão da magia ou do rito sacrificial. Não precisamos fazer, nem pagar promessas. 

Precisamos converter-nos. 

E conversão significa, neste contexto, romper o círculo vicioso sacrificial e reassumir nosso compromisso com os povos indígenas, seguindo (não imitando!) Jesus, o Irmão-Mestre, no meio deles, na lógica e na locura da gratuidade que é a condição de um mundo sem violência. 

Paulo Suess

" Pedras e Horizontes" - fevereiro de 2006