segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Na prática, a teologia (da libertação) é outra!

Desde o seu início, a Teologia da Libertação latino-americana assumiu que a sua especificidade ou originalidade não consistia em falar em favor dos pobres ou criticar o capitalismo. Pois, diversas teologias já tinham feito isso antes e estavam fazendo na época do surgimento da TL na América Latina. Entre as diversas características do que se chamou de "ruptura epistemológica” da TL, estava a relação dialética entre a teoria e práxis. Eu usei o termo "estava” porque sinto que muitos dos textos produzidos hoje do que ainda se entende como teologia da libertação não leva mais isso a sério.
Parafraseando livremente uma das afirmações de Marx sobre Feuerbach, que foi muito importante nessa ruptura epistemológica, podemos dizer: os teólogos já tem demasiadamente interpretado e até condenado o mundo moderno e o capitalismo, mas é preciso ir além e transformá-lo.
Quando se fala na transformação é preciso entender que não é um simplesmente prolongamento, um passo a mais, da interpretação e condenação. O momento prático de lutas de transformação é um momento qualitativamente diferente da crítica meramente teórica. Tomemos um exemplo para deixar essa ideia mais clara. Um teólogo pode criticar o capitalismo dizendo que o sistema de mercado, com sua concorrência e obsessão por eficiência econômica, é injusta e opressora. Mas, se não dá o passo seguinte de pensar e construir um sistema alternativo ou práticas econômicas mais justas, esse mesmo crítico não vai perceber que a práxis transformadora exige que as ideias críticas se "encarnem” dentro das realidades econômicas e sociais existentes e partir dos recursos materiais, humanos e de conhecimento existente criar algo alternativo. Isto é, exige que saia da postura de condenação abstrata e veja o que é possível fazer com e a partir do que temos hoje.
Na medida em que se defronta com as condições objetivas da realidade existente, teólogo/a precisa rever até mesmo a sua interpretação e condenação feitas antes da ação. Pois percebe que a crítica abstrata acaba por exigir e promete objetivos que não são viáveis, factíveis, no momento ou mesmo dentro das condições humana e histórica. É a práxis que nos dá consciência dos limites que enfrentamos.
Diante desses limites, há duas posições básicas. Uma é manter sua autoimagem de crítico radical e, na prática, abdicar fazer algo concreto ficando somente na postura de condenação. Outra é estabelecer uma relação dialética entre teologia e práxis e perceber que a crítica teológica possibilitou ver as injustiças do mundo e o horizonte de um mundo alternativo; e ao assumir lutas concretas, aprender da práxis a rever posições teológicas e de teorias sociais para que possamos construir alternativas concretas. Assim, por exemplo, reconhecer que não é possível organizar uma economia global alternativa sem nenhum mecanismo de mercado.
É claro que para o primeiro grupo, os críticos pseudorradicais, a relação dialética entre teologia e práxis aparece como reformismo inaceitável, como um tipo de conivência com o sistema. O segundo grupo, diferentemente, aprende que "na prática, a teologia (da libertação) é outra”. Aprende que críticas ou condenações abstratas, sem articulação com lutas de criação de alternativas concretas, podem ser suficientes para pessoas que vivem (ganham a vida) com discursos ou cursos, mas insuficientes para a criação de um outro mundo.
A Teologia da Libertação não nasceu para propagar imaginações radicais que servem de base para condenação abstrata do mundo existente, mas sim para refletir criticamente a teologia e fé cristã, questionando e respondendo questões que nascem da luta concreta pela construção de uma sociedade mais justa e humana.

 Jung Mo Sung

Fonte: Adital

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