sábado, 24 de março de 2012

Suplicy quer Leonardo Boff em ciclo de debates sobre a Rio+20

Um artigo de Leonardo Boff, publicado na imprensa esta semana, foi citado pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP) nesta quinta-feira (22), em Plenário, como uma importante reflexão para a Conferência Rio+20, a ser realizada no Rio de Janeiro em junho. Intitulado “Maximização versus otimização”, o texto fala dos efeitos nocivos do consumo desenfreado no homem e no planeta.

- O seu artigo nos lembra ensinamentos importantes para a Rio+20. Faz lembrar também aquilo que o nosso professor Paul Davidson e seu filho Greg Davidson falam em Economics for a Civilized Society, A economia para uma sociedade civilizada, que nos devemos levar em consideração, na hora de tomar decisões sobre instrumentos de política econômica, não simplesmente a busca do bem estar para si próprio, mas também aqueles outros valores como a busca da ética, da solidariedade, do amor, da fraternidade, da liberdade, da democracia – avaliou Suplicy.

Ex-integrante da ordem católica dos frades franciscanos, Leonardo Boff é teólogo, escritor e professor universitário, mas está atualmente desligado das funções de padre. Um dos precursores da chamada Teologia da Libertação, tem se dedicado a causas socioambientais. Seu pensamento fez com que o senador sugerisse à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) convidá-lo a participar das mesas redondas que o Senado está preparando para a Conferência Rio+20.



Há uma ética subjacente à cultura produtivista e consumista, hoje vastamente em crise por causa da pegada ecológica do planeta Terra, cujos limites foram ultrapassados em 30%. Nunca mais vamos ter a abundância de bens e serviços como até há pouco tempo dispúnhamos. A Terra precisa de um ano e meio para repor o que lhe extraímos durante um ano. E não parece que a fúria consumista esteja diminuindo. Pelo contrário, o sistema vigente para salvar-se, incentiva mais e mais o consumo que, por sua vez, requer mais e mais produção que acaba estressando ainda mais todos os ecossistemas e o planeta como um todo.

A ética que preside a este modo de viver é a da maximização de tudo o que fazemos: maximizar a construção de fábricas, de estradas, de carros, de combustíveis, de computadores, de celulares; maximizar programas de entretenimento, novelas, cursos, reciclagens, produção intelectual e científica. A roda da produção não pode parar, caso contrário ocorre um colapso no consumo e nos empregos. No fundo, é sempre mais do mesmo e sem o sentido dos limites suportáveis pela natureza.

Imitando Nietzsche perguntamos: quanto de maximização aguenta o estômago físico e espiritual humano? Chega-se a um ponto de saturação e o efeito direto é o vazio existencial. Descobre-se que a felicidade humana não está em maximizar, nem engordar a conta bancária, nem o número dos bens na cesta de produtos consumíveis. O fato é que o ser humano possui outras fomes: de comunicação, de solidariedade, de amor, de transcendência, entre outras. Estas, por sua natureza, são insaciáveis, pois podem crescer e se diversificar indefinidamente. Nelas se esconde o segredo da felicidade. Mas nas palavras do filósofo Ludwig Wittgenstein citando Santo Agostinho:“tivemos que construir caminhos tormentosos pelos quais fomos obrigados a caminhar com multiplicadas canseiras e sofrimentos, impostos aos filhos e filhas de Adão e Eva” para chegar a esta tão buscada felicidade.

Logicamente precisamos de certa quantidade de alimentos para sustentar a vida. Mas alimentos excessivos, maximizados, causam obesidade e doenças. Os países ricos maximizaram de tal maneira a oferta de meios de vida e a infra-estrutura meterial que dizimaram suas florestas (a Europa só possui 0,1% de suas florestas originais), destruíram ecossistemas e grande parte da biodiversidade, além de gestar perversas desigualdades entre ricos e pobres.

Devemos caminhar na direção de uma ética diferente, a da otimização. Ela se funda numa concepção sistêmica da natureza e da vida. Todos os sistemas vivos procuram otimizar as relações que sustentam a vida. O sistema busca um equilíbrio dinâmico, aproveitando todos os ingredientes da natureza, sem produzir lixo, otimizando a qualidade e inserindo a todos. Na esfera humana, esta otimização pressupõe o sentido de auto-limitação e a busca da justa medida. A base material sóbria e decente possibilita o desenvolvimento de algo não material que são os bens do espírito, como a solidariedade para com os mais vulneráveis, a compaixão, o amor que desfaz os mecanismos de agressividade, supera os preceitos e não permite que as diferenças sejam tratadas como desigualdades.

Talvez a crise atual do capital material, sempre limitado, nos enseje viver a partir do capital humano e espiritual, sempre ilimitado e aberto a novas expressões. Ele nos possibilita ter experiências espirituais de celebração do mistério da existência e de gratidão pelo nosso lugar no conjunto dos seres. Com isso maximizamos nossas potencialidades latentes, aquelas que guardam o segredo da plenitude, tão ansiada.

Leonardo Boff é autor de Tempo de Transcendência: o ser humano como projeto infinito, Vozes 2005.

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