quinta-feira, 29 de março de 2012

Fidel e Bento XVI: inspiração e flagelo da Teologia da Libertação



HAVANA, 28 Mar 2012 (AFP) -Fidel Castro, o homem que encarnou o marxismo revolucionário na América Latina, se reuniu nesta quarta-feira com Bento XVI, que auxiliou João Paulo II em sua luta contra a influência do marxismo na Igreja, expressa na Teologia da Libertação.

Nos anos 1970-1980, numerosos movimentos revolucionários do continente combinaram a influência do marxismo de Fidel Castro, apoio ideológico e material das guerrilhas, e a Teologia da Libertação, nascida na América do Sul nessa época.

Esta aliança entre marxistas e católicos partidários da teologia da libertação foi principalmente encarnada pelo sacerdote colombiano Camilo Torres, transformado em "padre guerrilheiro", que se uniu ao ELN, Exército de Libertação Nacional (guevarista) nos anos 60.

O papa polonês, que tinha vivido o comunismo, era visceralmente hostil à mistura da mensagem cristã, o marxismo e a revolução.

Bento XVI, como presidente da Congregação para a Doutrina da Fé sob o papado de João Paulo II, se encarregou de velar pela correta aplicação da doutrina da Igreja Católica. Apoiou totalmente e aplicou a vontade do Papa para frear ou afastar os religiosos que defendiam essa teologia.

Convencido de que tinham se desviado da doutrina da Igreja, Joseph Ratzinger convocou ou suspendeu a muitos desses teólogos que estavam na América Latina.

Também sancionou em 1984 o teólogo brasileiro Leonardo Boff, pedindo a ele que guardasse silêncio: "Faça silêncio até novo aviso", disse-lhe Ratzinger.

Nesse mesmo ano, criticou quem é considerado o "pai" desta teologia depois do Concílio Vaticano II, o sacerdote peruano Gustavo Gutiérrez, que foi submetido pela Congregação ao longo processo de diálogo e de esclarecimento.

Os bispos considerados "vermelhos" foram afastados ou perderam influência, como aconteceu com Dom Hélder Câmara, bispo emérito de Olinda e Recife. Outros, vindos do Opus Dei e de movimentos católicos conservadores, foram promovidos e chegaram a ser muito influentes, dando a impressão de um retrocesso da Igreja nos campos social e político.

Atualmente, o arcebispo de Lima, berço da teologia da libertação, é o ultraconservador Juan Luis Cipriani, do Opus Dei.

Consultado pela AFP, o cardeal hondurenho Oscar Andrés Rodríguez, presidente da Caritas Internacional, considerou que algumas boas intenções desta teologia continuam sendo válidas.

"Não acredito que se possa dar um único significado à Teologia da Libertação. Houve desvios rumo à violência armada que não eram da teologia, e foi isso o que foi condenado", explicou.

"O que continua sendo primordial é a preferência pelos pobres, que é o fio condutor de todas as conferências gerais do episcopado americano desde a de Medellín (1968) até a de Aparecida (2007). O compromisso social (dos bispos latinoamericanos) está muito claro (...) e um alegado retrocesso conservador pode ser obra de poucos", refletiu.

Apesar da semente desta teologia ter sido lançada na Colômbia, na conferência do espiscopado latino-americano de 1968, alcançou uma tímida manifestação neste país, focada em reduzidos setores da Igreja, sem ter o impacto nem a transcendência que teve em outros países.

O momento mais simbólico da repreensão aos sacerdotes latino-americanos comprometidos politicamente foi o dedo levantado de João Paulo II humilhando o sacerdote nicaraguense Ernesto Cardenal durante uma missa em 1983, que então era ministro do governo sandinista.

Em 1986, em uma entrevista com um dos expoentes da teologia da libertação, o religioso brasileiro Frei Betto, Fidel Castro se negou a colocar mais lenha na fogueira: "Atualmente, ante um problema dessa envergadura, de discussões no seio da Igreja, me sinto no dever de ser prudente e de evitar emitir opiniões que poderiam gerar polêmica ou divisões internas em uma corrente religiosa", disse o líder da revolução cubana.

No avião que o levou na sexta-feira ao México, o Papa não respondeu a uma pergunta sobre a teologia da libertação, dizendo simplesmente que já não era atual.

A polêmica está atualmente aplacada e o último bispo do continente que o Papa Bento XVI investiu como cardeal em fevereiro, o brasileiro João Braz de Aviz, é julgado como progressista e favorável a teologia da libertação.

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