domingo, 22 de janeiro de 2012

Que há por trás da desocupação brutal do Pinheirinho - Moradores de área integrada em SP vão dormir em tenda com lama

As duas grandes tendas que foram armadas no Centro Poliesportivo do Campo dos Alemães para socorrer os moradores que foram retirados de suas casas na ação de reintegração de posse de Pinheirinho, em São José dos Campos (97 km de SP), se encontram em condições precárias.

Apesar de terem sido montadas para a triagem e orientação das famílias sobre abrigos provisórios oferecidos pela prefeitura local, as tendas não possuem proteção lateral.



Abrigo improvisado estava com lama e não havia colchões ou cobertores para as famílias que vão dormir no local
Abrigo improvisado estava com lama e não havia colchões ou cobertores para as famílias que vão dormir no local

Uma delas tem um piso de madeira, mas a outra está enlameada devido à chuva que caiu na cidade neste domingo. Nos dois locais, há apenas algumas cadeiras para os desabrigados.

Segundo a assessoria de imprensa da prefeitura, os abrigos estão em escolas e tendas improvisadas. Os trabalhos de instalação dos pisos nas tendas, afirmou, tiveram início na última quinta-feira (19).

A diretora do setor de desenvolvimento social da prefeitura, Quitéria de Freitas, disse à Folha que os endereços dos abrigos não seriam divulgados por questões de segurança.




Tenda foi montada em centro esportivo de São José dos Campos (SP) para atender moradores de Pinheirinho
Tenda foi montada em centro esportivo de São José dos Campos (SP) para atender moradores de Pinheirinho

A reportagem do jornal visitou o centro poliesportivo. Havia banheiros químicos, mas não colchões ou cobertores para aqueles que vão pernoitar. Também faltava água e comida.

"Falaram que iriam trazer janta, e até agora nada", disse a cozinheira Eva Oliveira da Silva, 23, que está com o marido e uma filha de um ano em uma das tendas. "Ninguém explica para aonde vamos. Mandaram a gente vir para cá e ficar aqui. Todos os meus móveis e eletrodomésticos ficaram dentro da minha casa."

A assessoria explicou que estavam programadas 5.000 refeições para atender os moradores na hora do almoço.




A cozinheira Eva Oliveira da Silva, que está com o marido e a filha no abrigo, reclamou da falta de informação
A cozinheira Eva Oliveira da Silva, que está com o marido e a filha no abrigo, reclamou da falta de informação

Fotos, reportagem: Julianna Granjeia/Folhapress
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overnador Alckmin pretende ser o ultra-conservador que “garante a ordem”, investe contra os pobres insubmissos e confirma subordinação do Estado aos interesses da oligarquia

Será preciso, nas próximas horas, processar todos os dados. Mas ao que tudo indica, acaba de ocorrer, em São José dos Campos, um massacre e algo mais. O desalojamento de centenas de famílias, que constituíram um bairro vivo, num latifúndio urbano (1 milhão de m²) antes reduzido à especulação imobiliária. seria, por si mesmo, um escândalo.

Mas há agravantes. Naji Nahas, que reivindica a “propriedade” do latifúndio, é um especulador condenado, num país em que a justiça tradicionalmente fecha os olhos (e a política institucional corteja…) os corruptores e criminosos de colarinho branco.

Mais: havia uma trégua em curso, acertada por todas as partes, e uma decisão da Justiça Federal mandando suspender a mal-chamada “reintegração de posse”. O caso ganhou notoriedade nacional e internacional há pouca semanas. Cansados de tantas arbitrariedades, alguns membros da ocupação vestiram-se de uniformes de resistência improvisados, numa encenação artística do que pode vir ser o contra-poder popular.



O governo de Geraldo Alckmin, ligado ao fundamentalismo cristão de direita e o Tribunal de Justiça de São Paulo, conhecido por seus laços com o que há de mais feudal e escravocrata na oligarquia paulista, não toleraram a hipótese de diálogo, muito menos a irreverência das imagens. Num país em que a oposição tradicional parece paralisada, Alckmin pretende, ao que tudo indica, ocupar o espaço da violência contra os pobres insubmissos e da submissão do Estado aos interesses do capital que se liga a oligarquia.

É provável que tenha se mobilizado por isso. Certamente, não ignorava o acordo firmado, há poucos dias, entre os movimentos de sem-teto e a Justiça Federal. Quis mostrar que não o respeita; que seu projeto político inclui até mesmo passar por cima das negociações que buscam a conciliação social, quando esta não serve à oligarquia financeira.

Não se sabe, a esta altura (19h30 de domingo, 22/1) quantas foram as vítimas pessoais desta deriva ultra-conservadora do governador de São Paulo. Mas já é possível enxergar que entre as vítimas está a democracia.


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Com armas de combate e carros blindados, a Polícia Militar de São Paulo realizou uma operação de guerra em São José dos Campos.

Colocou helicópteros, cães, armamento, escudos, ROTA, tropa de choque, quase dois mil homens a serviço da “reintegração” da ocupação Pinheirinho.

Em 2004, com mais de 1 milhão de metros quadrados, Pinheirinho era um terreno abandonado. Começou a ser ocupado por famílias pobres da região do Vale do Paraíba – entre São Paulo e Rio de Janeiro.

Em 2012, quando as tropas chegaram, seis mil pessoas viviam no Pinheirinho. Tornou-se um bairro pobre como qualquer outro, com lojas, igrejas, esgoto a céu aberto, ruas de terra, biroscas, miséria, casas em situação precária.

O terreno pertence a Selecta S/A, uma empresa falida controlada por Naji Nahas. Essa é a informação mais importante até aqui. Logo veremos porque o Tribunal de Justiça de São Paulo e o comandante da Polícia Militar, o governador Geraldo Alckmin, não tinham outra saída além de atender Nahas.

Ação entre amigos

Existia uma negociação avançada para resolver o problema sem o uso da força. Por conta disso, por duas vezes, o Tribunal Regional Federal (TRF) cassou a liminar que determinava a reintegração de posse: na sexta feira e no próprio dia da invasão, domingo. Nada disso foi levado em conta.

Mesmo no domingo, quando a ordem do TRF foi enviada diretamente ao comando das operações no Pinheirinho. Quem recebeu o oficial de justiça foi ninguém menos do que o desembargador Rodrigo Capez, que respondia pela presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Capaz não estava ali para cumprir seu dever cívico ou suas obrigações como desembargador. Estava ali para dar uma carteirada no oficial de justiça do TRF.

“A ação da Polícia Militar continua”, anunciou o desembargador. Segundo a Ordem dos Advogados do Brasil, ao fazer isso Capez rompeu o “pacto federativo”. Mas quem se importa? O que acontecia ali era algo mais importante: uma ação entre amigos.

Entenda por quê: O desembargador Rodrigo Capez é irmão do deputado estadual Fernando Capez, do PSDB, o mesmo partido do governador Geraldo Alckmin, o mesmo partido do prefeito de São José dos Campos, Eduardo Cury.

Essas pessoas são amigas entre si. Frequentam os mesmos jantares, tem os mesmos financiadores de campanha, são amigos de gente que é muito, mas muito amiga de Naji Nahas. E todos tem grandes amigos no Tribunal de Justiça de São Paulo.

Por isso, o prefeito Eduardo Cury não fez o que deveria ter feito para proteger o seu povo: desapropriar o terreno e inscrever os moradores em um programa habitacional. De fato, o terreno só pertence a Naji Nahas porque o prefeito Eduardo Cury operou o tempo todo a favor do megainvestidor.

Pois da massa falida da Selecta, o único credor que ainda falta ser pago é… …adivinhe? Sim, o município de São José dos Campos. A Selecta deve 10 milhões só em IPTU atrasado.

O terreno deveria ter sido desapropriado e inscrito no programa habitacional do governo federal, o Cidade Legal. Esse assunto, inclusive, seria tema de uma reunião entre o prefeito e o secretário geral da presidência da república, Gilberto Carvalho, na quinta feira 19.

Inesperadamente, o prefeito cancelou a reunião com Carvalho, sem dar motivos. Ele já sabia da invasão e nesse momento atuava como homem forte a favor de Naji Nahas. Para defender os interesses do megapicareta, empastelou a negociação com o governo federal. Fora isso, a reintegração de posse nunca deveria ter sido emitida. Está baseada em um documento caduco.

A história é mais ou menos assim: A primeira liminar de reintegração foi emitida pela 18ª Vara de Falências de São Paulo. Essa liminar foi cassada, pois a Vara da capital não pode discutir posse de área em outra cidade. A massa falida então pediu reintegração à 6ª Vara Civil de São José dos Campos, que negou a ação de reintegração.

A massa falida então recorreu ao TJSP, que agora autoriza, mas não avisa o juizado de São José, o que caracterizou erro processual. Por conta do erro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou todo o recurso da massa falida.

Agora pasme: baseado no recurso que começou na Vara de Falência de São Paulo e foi anulado pelo STJ, a juíza Márcia Loureiro, de São José dos Campos, reabriu o processo que culminou com a invasão da PM. Márcia Loureiro é uma conhecida e ferrenha militante a favor da reintegração de posse, ou seja, a favor de Naji Nahas. Essas coisas não acontecem por acaso.

A começar pelo desembargador irmão do deputado, que faz parte da base de Alckmin, que é do mesmo partido do prefeito, que opera a favor de Naji Nahas, que é amigo de Daniel Dantas. Daniel Dantas???

Mas o que uma coisa tem a ver com outra? Dantas e Nahas foram sócios em operações criminosas descobertas pela operação Satiagraha, posteriormente anulada pelo STJ. A dupla, diziam as investigações, subornava políticos e juízes como quem troca de camisas. Mas tudo foi extinto, anulado.

Durante as privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso, Dantas e Nahas, ganharam rios de dinheiro em esquemas envolvendo estatais.

Você sabe, Fernando Henrique, que é do PSDB, o partido do prefeito, que é o partido do governador, que é o partido do deputado, que é irmão do desembargador.

E que são amigos de Nahas e Dantas, que são amigos de muita, mas muita, mas muita gente que deve favores a eles, inclusive juízes, desembargadores, políticos…

O Tribunal de Justiça de São Paulo e o comandante da Polícia Militar, o governador Geraldo Alckmin, não tinham outra saída além de atender Nahas.


Marques Casara





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