Temas particularmente caros aos teólogos da libertação, que, partindo da América do Sul, catalizaram, nos anos 1970 e 1980, o debate eclesial sobretudo no Terceiro Mundo. Até às "fugas à frente" condenadas e sancionadas pela Santa Sé. As comunidades eclesiais de base (CEBs), núcleos ecumênicos comprometidos em viver uma fé de participação nos problemas da sociedade, que colocaram raízes um pouco em todos os países, mas especialmente no Brasil e na Nicarágua, tiveram uma notável difusão nesse período. No Brasil, graças também ao apoio do cardeal de São Paulo, Paulo Evaristo Arns, e do bispo Helder P. Câmara, surgiram quase 100 mil. Na Nicarágua, inúmeros sacerdotes e leigos católicos participaram da luta armada contra a ditadura de A. Somoza e, depois, sacerdotes como Ernesto Cardenal e Miguel D'Escoto entraram no governo sandinista.
A terceira reunião do Celam (Conselho Episcopal Latino-Americano), realizado em Puebla, no México, em 1979, embora reafirmando e desenvolvendo os princípios elaborados em Medellín, também evidenciou o surgimento de uma forte oposição, trazida por setores conservadores, às teses da teologia da libertação. Essa oposição foi se reforçando nos anos 1980 graças ao apoio do Papa João Paulo II.
Os principais artífices da teologia da libertação foram progressivamente afastados dos nós hierárquicos superiores, e o seu campo de ação foi gradualmente reduzido. Emblemático foi o caso do frei franciscano Leonardo Boff, que, depois de diversos processos eclesiásticos, abandonou a ordem em 1992.
Agora, com tons de dolorosa solicitude social, a exortação que surgiu do Sínodo para a África, indica claramente a necessidade de combater "a exploração e a malversação locais e estrangeiras" que privam as populações africanas dos seus próprios recursos naturais, aumentando a "pobreza" e impedindo "que os povos africanos consolidem as suas próprias economias". Por isso, o papa pede que os governos protejam os "bens fundamentais, como a terra e a água" para a vida das gerações futuras e para a paz.
A lembrança afetuosa do ex-decano do Sacro Colégio, o cardeal Bernardin Gantin (desde o início, atento às instâncias da teologia da libertação) é significativo a esse respeito. O papa elogia o seu "senso de discernimento, a capacidade de não cair em certas fraseologias, mas de entender o que era o essencial e o que não fazia sentido", com uma referência que parece atribuível justamente à sua atitude diante da teologia da libertação.
"O Benin é o país do meu caro amigo, o cardeal Bernardin Gantin: eu sempre tive o desejo de rezar, um dia, em seu túmulo", afirmou Bento XVI. "Para mim, ele foi realmente um grande amigo e, portanto, visitar o país do cardeal Gantin, como um grande representante da África católica e da África humana e civil, é para mim um dos motivos pelos quais queria vir a este país".
Depois, o pontífice recorda: "Eu vi o cardeal Gantin pela primeira vez na minha ordenação a arcebispo de Munique, em 1977. Ele tinha vindo porque um dos seus alunos era meu discípulo: assim, idealmente, já existia entre uma amizade, sem ainda nos termos visto. Nesse dia decisivo da minha ordenação episcopal, foi bonito para mim encontrar esse jovem bispo africano, cheio de fé, alegria e coragem".
Assim, acrescenta: "Colaboramos muito entre nós, sobretudo quando ele era prefeito da Congregação para os Bispos e depois no Sacro Colégio. Eu sempre admirei a sua inteligência prática e profunda, o seu senso de discernimento, de não cair em certas fraseologias, mas de entender o que era o essencial e o que não fazia sentido. E depois o seu verdadeiro senso de humor, que era muito bonito". E, acima de tudo, enfatiza Joseph Ratzinger, ele era" um homem de profunda fé e de oração. Tudo isso fez do cardeal Gantin não só um amigo, mas também um exemplo a seguir, um grande bispo africano, católico. Estou realmente satisfeito de pode agora rezar sobre o seu túmulo e sentir a sua proximidade e a sua grande fé, que o torna, para mim, um exemplo e um amigo".
A reedição em terras africanas da opção preferencial pelos pobres, obviamente, não equivale a "apagar" os excessos da corrente de pensamento católica, que se desenvolveu na América Latina e que tende a evidenciar os valores de emancipação social e política presentes na mensagem cristã. Ainda mais que os cristãos de base atribuem a João Paulo II o fato de ter "normalizado", nos anos 1980 e 1990, o clero e o episcopado sul-americanos e de tê-lo repleto de expoentes do Opus Dei e dos Legionários de Cristo, colocando à margem aqueles teólogos da libertação que haviam deslocado muito para a esquerda o baricentro da Igreja, dialogando com aquele comunismo que o Vaticano, ao contrário, estava combatendo no Leste Europeu.
E a atual e dramática hemorragia de fiéis em favor das seitas evangélicas seria também o fruto da marginalização dos padres em mais estreito contato com as classes populares e com as massas das favelas. O nascimento do movimento remonta ao Celam, realizado em 1968 em Medellín, na Colômbia, quando os representantes da hierarquia eclesiástica do subcontinente tomaram uma posição em favor dos grupos mais desfavorecidos da sociedade latino-americana e da sua luta e se pronunciaram em favor de uma Igreja popular e socialmente ativa.
A denominação tornou-se universal depois da publicação do livro do sacerdote peruano Gustavo Gutiérrez, Teologia da Libertação (1971). A difusão em quase todo o subcontinente, durante os anos 1970, de ditaduras militares ou de regimes fortemente repressivos, muitas vezes causa de agudos atritos entre amplos setores da Igreja Católica e os poderes constituídos, incentivou o compromisso dos teólogos da libertação que estavam elaborando propostas cada vez mais radicais para enfrentar o agravamento da crise política e social latino-americana.
A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no sítio Vatican Insider, 19-11-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Fonte: IHU
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