Carta às comunidades e a todo o Povo de Deus da Diocese de Ruy Barbosa
Nós, os mais de 120 participantes do Encontrão Diocesano das Comunidades Eclesiais
de Base, da Diocese de Ruy Barbosa, delegadas e delegados de 20 redes de comunidades,
cheios de ânimo e alegria contagiantes, chegamos no dia 22 de setembro de 2011, na terra do
café, cidade do Bonito, lugar frio mas onde fomos aquecidos pelo calor humano deste povo.
Fomos recebidos na capela de Santo Antônio e saímos em caminhada pelas ruas da
cidade anunciando que o povo das comunidades chegou. No ginásio de esportes participamos
da abertura, onde celebramos nossa fé à luz da Palavra de Deus, lembramos e
homenageamos a figura do Pe. José Comblin e nele a todas as pessoas que fizeram e fazem
de sua vida uma semente no meio do nosso povo.
Depois de descansar nas casas das famílias onde fomos fraternalmente acolhidos e
acolhidas, começamos um novo dia com a oração matinal e logo em seguida, Rubem Siqueira,
da CPT nacional, fez para nós uma análise de conjuntura, falando sobre o tema do nosso
Encontrão: “CEBs na atual realidade. Um jeito de ser Igreja que constrói um mundo sem
males”. Partindo das dificuldades constatou que não podemos ser uma igreja de CEBs sem
procurar transformar a realidade, e que nessa missão cada um de nós tem um papel
importante.
Depois da partilha em pequenos grupos, partindo das lutas do nosso povo desde a
ditadura militar, foi constatado que ainda existe a exclusão de famílias que estão em situação
de pobreza, mesmo reconhecendo algumas melhorias na vida do povo. Diante disto, o povo,
sobretudo os jovens, se veem obrigados a migrar pela falta de políticas públicas de inclusão,
trabalho e as condições climáticas. Percebemos o crescimento da indiferença religiosa, o
enfraquecimento das comunidades (faltam novas lideranças, há pouca participação, pessoas
que procuram cura, sacramentos no “mercado religioso”), o surgimento de novas
denominações religiosas que ameaçam o trabalho pastoral, o enfraquecimento dos
movimentos sociais (houve um conformismo com os programas sociais, com isso a massa
deixou de lutar pelos seus direitos), realidade que também faz parte da vida da Igreja (falta de
solidariedade, de testemunho na luta, muitos pensam que trabalhar no social é incompatível
com a espiritualidade, a CPT e outras pastorais sociais sentem a falta de novos missionários/as
para assumir a caminhada). Mesmo assim constatamos que a Diocese está organizada (as
Diretrizes e Orientações Diocesanas fortaleceram e deram solidez ás comunidades) e procura
as pessoas, mas existe ainda certo comodismo.
A juventude luta por paz, solidariedade, partilha e acolhimento, pede que a Igreja vá ao
seu encontro para resgatar os envolvidos em drogas, álcool, sexo banalizado, e os convide a
caminhar com Cristo, dando espaço, apoio, valorização e liberdade.
Não podemos fugir da realidade, Deus está na terra, se faz presente em nosso meio. As
CEBs são espaços para uma discussão profunda sobre a realidade existente, e assim poder
transformá-la. Não podemos fechar os olhos diante da situação ambiental (mineradoras,
plantação de eucalipto, mudança da lei ambiental) nem política (corrupção).
Na tarde do dia 23 e a manhã do dia 24, fomos às comunidades da cidade para
trabalhar em cinco oficinas: ser comunidade, cidadania, relações de gênero, grandes
projetos e jovens na comunidade. Somos comunidade e precisamos ter como referência a
experiência das comunidades primitivas, saber o que eles faziam para a partir daí, avaliar
nosso jeito de caminhar, encarnando nossa fé na realidade, nos importando mais com a
qualidade do que com a quantidade. Os direitos são um dom (todo ser humano tem dignidade),
mas também uma conquista que precisa lutar para alcançar. Estamos engatinhando na
conquista dos direitos, em todos os campos, também na Igreja (esquecemos que pelo batismo
todos/as somos sacerdotes, profetas e reis). Devemos distinguir entre sexo e gênero para criar
a igualdade respeitando a diversidade. Fazer que nossas comunidades possam refletir, à luz
da Palavra de Deus e das atitudes de Jesus, para evitar discriminações. Constatamos a
realidade gritante dos grandes projetos, que geram trabalho escravo, migração, desmatamento,
e a tripla atitude do estado (aliado com os poderosos em troca de favores) como influenciador,
financiador e assistencialista. Junto aos jovens, somos chamados a acompanhar os espaços
em que eles habitam, abrir as portas das nossas comunidades, sermos conscientes de que, a
pesar de algumas atitudes individualistas, a juventude de hoje é generosa, idealista e faz
muitas coisas interessantes, que nem sempre são reconhecidas.
A partir daqui assumimos alguns compromissos como comunidades:
· Para ser comunidade: ser perseverante na Palavra de Deus, no convite, na busca pela
união, no compromisso, na justiça,solidariedade e no amor, pois somos responsáveis
pela transformação da sociedade, para que aconteça o reino de Deus através da busca
de novos instrumentos de lutas, para concretizar a Palavra no hoje da vida. Celebrar as
conquistas e avaliar a vivência comunitária, através do diálogo e do entendimento.
· No nível da cidadania: mobilizar o povo para anunciar e denunciar; participar
efetivamente nos conselhos; exercer o direito de pedido de informação aos órgãos
públicos; fiscalizar as contas públicas; reativar os foros de cidadania; usar mais os meios
de comunicação; participar nos conselhos de políticas públicas; atuar nos sindicatos e
associações; usar a tribuna livre na câmara; procurar o ministério público na defesa dos
direitos.
· Nas relações de gênero: fazer valer os nossos direitos na busca da igualdade; lutar para
vencer a cultura da dependência, deixando de lado o jeito piramidal nas comunidades;
dialogar sem medo com o diferente para poder resolver os conflitos; ir, a exemplo de
Jesus, ao encontro do povo onde estiver; superar preconceitos e discriminações; mudar
as leis que não trazem vida, nem transformações.
· A respeito dos grandes projetos: resgatar o jeito de ser igreja partindo da realidade do
povo e construir um mundo sem males, se organizando e participando das lutas
concretas.
· Com a juventude: valorizar o trabalho e o potencial dos jovens na comunidade; fazer-se
presente nos grupos e movimentos sociais como Igreja; criar novas metodologias de
trabalho com eles; ajudá-los a superar os problemas, sobretudo os relacionados com
drogas e migração.
Agradecemos àqueles que assessoraram estas oficinas: Eloi, Dito, Teresinha, Cláudio,
Luciano, Jailton, Cleusa, João Miguel que animou, e as pessoas das comunidades que fizeram
o Encontrão acontecer.
Somos conscientes de que tudo isto valerá a pena se for vivenciado em nossas
comunidades, na base. Que Deus, nosso Pai e Mãe, abençoe a caminhada das comunidades
da nossa Diocese, especialmente aquelas que no Bonito nos acolheram com o coração e nos
ajudaram a sentirmos em casa, ao lado de irmãs e irmãos que acreditam no Deus da Vida e o
seguem na mesma caminhada.
Bonito, 25 de setembro de 2011
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