Foi no dia 28 de setembro de 1971 que Sena Madureira registrou o maior acidente aéreo de sua história. Minutos após ter feito a decolagem, o avião DC3, da empresa Cruzeiro do Sul, que viajava com destino a Rio Branco, apresentou problemas no motor, bateu em uma árvore e caiu em um matagal na comunidade Boca do Caeté.
Para Lhé, dom Giocondo era um “bispo vermelho”
Centenas de pessoas participaram da missa ontem na Catedral Nossa Senhora de Nazaré para lembrar o acidente de avião DC-3 que tirou a vida do bispo dom Giocondo Grotti e mais 32 pessoas na zona rural de Sena Madureira. A tragédia completa 40 anos e até hoje emociona muitos acreanos. Assim como seu sucessor (Moacyr Grecchi), o jovem italiano Giocondo ficou conhecido por ter envolvimento político forte e por demonstrar preocupação social quanto à realidade com que se deparava na região. Na época, conseguia toneladas de alimentos da Itália para serem distribuídas aos pobres de Rio Branco. O bispo estudou direito na Universidade Federal do Acre (Ufac) e dizia fazê-lo para defender os deserdados. Foi ele quem construiu a Colônia Souza Araújo e o Hospital Santa Juliana. Teve ainda papel fundamental para a criação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) no Estado e foi um dos principais críticos do regime militar que se instalou no país. Um dos fundadores do PT e amigo de Giocondo, Abrahim Farhat, o “Lhé”, chama-o de “bispo vermelho”, pois parecia acolher as ideias progressistas que se disseminavam dentro da Igreja Católica, buscando conciliar marxismo com cristianismo. “Tive a satisfação de conhecer um bispo que tinha opção política pelos pobres”, afirmou Abrahim, que, mesmo não sendo católico, era uma das pessoas mais queridas e solicitadas pelo religioso. “Nos respeitávamos na diferença.” Abrahim compara o bispo a dom Hélder Câmara, dom Pedro Casaldáliga, dom Paulo Evaristo Arns e dom Oscar Romero, religiosos que se empenharam ativamente contra os regimes militares da América Latina. Os bispos seguiam à risca a Conferência de Puebla, a qual assumira amplamente o tema da evangelização libertadora. “A morte de Giocondo foi uma grande perda para os movimentos sociais”, lamentou. As comunidades de base fundadas por Giocondo não eram somente lugares de oração, mas também espaços políticos, em que os fiéis aprendiam sobre política, questionavam os problemas e procuravam solucioná-los. São dessa época a ex-vereadora Francisca Marinheiro, Rita Batista, Kléber Barros, Manoel Pacífico, padre Pedro Martinello e outras lideranças. “Começava a nascer um católico politizado, que não se conformava em viver na pobreza”, diz Abrahim. Giocondo, ao dar a bênção na inauguração do jornal O Rio Branco, do empresário Assis Chateaubriand, quase foi agredido por um militar por ter falado de liberdades democráticas na cerimônia. “Esse bispo causava inquietação ao governo local”, revelou outro amigo dele, o ativista dos direitos humanos Eudo Lustosa, criado pelo religioso desde criança. Abrahim, que combateu ferozmente a ditadura, é um dos que desconfiam dos relatos oficiais de que o avião tenha caído por falhas mecânicas. Segundo ele, na época ocorria a Operação Condor, uma aliança político-militar entre os vários regimes militares da América do Sul para reprimir e eliminar líderes de esquerda, com apoio dos Estados Unidos. Já era de conhecimento também dos militares que o líder revolucionário Che Guevara percorria a Amazônia. “O bispo era visto como um perigo, principalmente pelo comportamento dele, ainda mais com a presença de Che Guevara por aqui”, sustentou. Edinaldo Gomes |
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