quarta-feira, 30 de março de 2011

O FMI e a Comissão Europeia organizam o saque da Grécia

Enquanto o povo é confrontado com uma destruição generalizada das conquistas sociais (reduções de salários e pensões, aumentos dos impostos indiretos, aumento da idade de reforma, privatização e aumento das taxas de serviços públicos…), a Grécia compra armamento da França (6 fragatas FREMM de cerca de 500 milhões de euros cada e helicópteros de combate SAR) e da Alemanha (submarinos). O governo grego às ordens da troica FMI-CE-BCE, culpado de falta de assistência à população em perigo, organiza o saque do país em benefício do grande capital. Jérome Duval

Enquanto o desemprego continua a subir depois de ter passado de 9,7% para 12,9% da população ativa entre o 3º trimestre de 2009 e o 3º trimestre de 2010 (cerca de 34% dos menores de 25 anos estão desempregados), o povo continua a mobilização contra os planos de austeridade de orientação ultraliberal e conformes ao “consenso” de Washington.

Essa política promovida pela troica – Fundo Monetário Internacional (FMI), Comissão Europeia (CE), Banco Central Europeu (BCE) – em troca de ajuda financeira para fazer face ao pagamento da dívida pública é digna daquela que levou a Argentina, aluno modelo do FMI, a uma crise memorável em 2001. Os meios de comunicação dominantes escondem-nos o orçamento militar grego que não cessa de agravar o déficit. No entanto, este é, proporcionalmente ao PIB, o mais significativo dos países membros da OTAN depois dos Estados Unidos e representou 4% do PIB em 2009. Será que os traficantes de armas proprietários de impérios midiáticos, como Dassault ou Lagardère, não querem comprometer um mercado lucrativo?

Enquanto o povo é confrontado com uma destruição generalizada das conquistas sociais (reduções de salários e pensões, aumentos dos impostos indiretos, aumento da idade de reforma, privatização e aumento das taxas de serviços públicos…), a Grécia compra armamento à França (6 fragatas FREMM de cerca de 500 milhões de euros cada e helicópteros de combate SAR) e à Alemanha (submarinos). Essas compras de armamento em tempo de austeridade drástica para a população são inadmissíveis. O dinheiro roubado à população para comprar material militar deve ser devolvido na íntegra e os responsáveis levados à justiça.

Segundo o SIPRI (Stockholm International Peace Research Institute), a Grécia é o país europeu que mais dinheiro gasta na Defesa em relação ao seu produto interno bruto (PIB) e está entre os 10 maiores compradores de armas no mundo. Trata-se de um comportamento odioso e irresponsável para com a sua própria população, que dessangra para reabastecer os cofres do Estado.

Em maio de 2010, segundo o Ministério da Defesa francês questionado pelo deputado François Cornut-Gentille, “nenhuma das medidas de contenção orçamentária suplementares decididas no mês de março de 2010, na sequência da intervenção da União Europeia, deverá afetar, este ano, o orçamento de aquisição do Ministério da Defesa grego. (…) as etapas de aquisição de fragatas tipo FREMM (fragatas multi-missão) e de helicópteros SAR (busca e salvamento) permanecem, portanto, vigentes”.

A Grécia assinou com o FMI e a União Europeia novos empréstimos mal chamados “ajuda”. Ao tentar reduzir o déficit à custa de incríveis sacrifícios, o país deverá pagar uma dívida sobrecarregada com juros cada vez mais elevados à medida que as agências de notação degradam a classificação do país.

Em dezembro de 2010, os deputados gregos aprovaram um novo pacote de cortes orçamentários que consiste em reduzir os salários dos funcionários da televisão e dos transportes públicos. Os jornalistas gregos juntaram-se aos protestos que percorrem o país e, em Atenas, a entrada do Banco Central foi pulverizada com tinta vermelha. Em fevereiro de 2011, foi a vez dos médicos, farmacêuticos e profissionais da área médica se manifestarem à frente do parlamento contra uma redução de 1,4 mil milhões de euros em despesas de saúde exigida pela União Europeia (UE) e pelo FMI, enquanto uma centena de médicos acampavam em frente ao Ministério da Saúde, em Atenas.

A delegação do FMI e da UE enviada para o local em Atenas, a 7 de fevereiro de 2011, aguardará a execução da reforma do sistema de saúde, antes de dar o sinal verde para o pagamento da quarta parcela do empréstimo – no montante de 15 bilhões de euros – inicialmente previsto para fevereiro de 2011. A cada vez, medidas sempre mais liberais exigidas pela UE e o FMI são o pré-requisito para desbloquear as parcelas sucessivas no quadro do empréstimo de 110 bilhões aprovado em maio de 2010.

O governo grego às ordens da troica FMI-CE-BCE, culpado de falta de assistência à população em perigo, organiza o saque do país em benefício do grande capital

Mas, como se isso não bastasse, os credores exigem uma “aceleração decisiva” das reformas estruturais para reduzir a dívida e atrasam o pagamento da quarta parcela. Em fevereiro de 2011, o governo de Georgios Papandreou acabou por reagir quando mais uma vez a troica FMI-CE-BCE pediu o aprofundamento das reformas e o aumento da sua meta de privatização de bens públicos do Estado, passando de 7 bilhões de euros de receita a realizar até 2013, dos quais 1 bilhão em 2011, para 50 bilhões até 2015. Essa reação faz-nos sorrir quando vemos a total submissão aos seus credores por parte de um governo que se auto-denomina socialista.

De resto, levou apenas alguns dias para que Papaconstantinou, Ministro das Finanças, voltasse atrás e indicasse que “o objetivo” deste plano de privatização de 50 bilhões «era certamente ambicioso, mas exequível», aceitando de novo a ingerência do FMI, secundado pela Comissão Europeia… São então visados os portos, os aeroportos, os caminhos-de-ferro, a electricidade, assim como praias turísticas do país. O representante da Comissão Europeia, Servaas Deroose, propôs no diário To Vilma, a “venda das praias para o desenvolvimento do turismo e do mercado dos imóveis turísticos”. Noutra entrevista, acrescentou: “A Grécia poderia facilmente arrecadar cinco bilhões de euros vendendo o antigo aeroporto de Atenas, localizado numa zona costeira lucrativa”. Por seu lado, o chefe da missão do FMI, Poul Thomsen, sugeriu a “venda de terrenos, incluindo o antigo aeroporto” de Atenas. “Estamos num momento crucial em que precisamos de uma aceleração das reformas”, teria ele declarado, segundo o diário Kathimerini.

A contração, mais severa do que o previsto pelas instituições, do PIB grego em 1,4% no quarto trimestre de 2010, uma inflação galopante de 5,2% em janeiro de 2011, bem como a queda das receitas dos gregos, que caíram 9% em 2010 sob o efeito das medidas de austeridade, dão uma ideia do rotundo fracasso da política da troica FMI-CE-BCE. De acordo com o Banco da Grécia, “O poder de compra dos funcionários públicos recuou para um nível inferior ao de 2003, enquanto no conjunto da economia o poder de compra recuou em média para um nível inferior ao de 2006”. Por seu lado, os investidores são incentivados a fazer negócios suculentos por meio de uma redução dos custos trabalhistas de 3% em média no país.

Não há com que acalmar uma população já golpeada pela crise, e uma greve geral paralisou o país em 23 de fevereiro de 2011. O povo grego tem o direito de exigir outras medidas radicalmente diferentes, como a tributação dos rendimentos elevados e uma moratória sobre a compra de armamento militar. Mas só uma auditoria das contas públicas do Estado sob controle cidadão poderá analisar os acordos da dívida, a fim de restituir a parte ilegítima ou odiosa ao verdadeiro credor que reivindica soberania e dignidade: o povo grego. É necessário, a este respeito, saudar a iniciativa da deputada Sophia Sakorafa que, em dezembro de 2010, propôs ao parlamento grego a constituição de uma Comissão Parlamentar de auditoria da dívida pública.

Jérome Duval

Fonte: Carta Maior

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