A relação das religiões com a paz do mundo requer uma abordagem complexa, a partir de muitos pontos de vista. Nosso documento se concentra na perspectiva da teologia do pluralismo; não aborda outras perspectivas igualmente necessárias. Em algumas regiões, a perspectiva pluralista já foi assumida na prática, e o problema é proposto mais a partir da laicidade da sociedade, à margem do protagonismo das religiões.
Neste documento, não elaboramos uma teologia "cristã" do pluralismo religioso. Situamo-nos em uma perspectiva mais ampla, a do mundo global das religiões. Metodologicamente, colocamos entre parênteses as questões cristãs concretas que a aceitação do pluralismo suscita, deixando-as para um documento posterior.
Dirigimo-nos ao leitor médio da rua, no amplo mundo das religiões. Dirigimo-nos também aos especialistas, mas sem querer deixar de ser acessíveis ao povo simples.
Pluralismo, sinal dos novos tempos
A sociedade atual tornou-se enormemente plural, cultural e religiosamente. Isso se converteu em uma fonte de conflitos permanente. É lugar comum que vivemos hoje um "choque de civilizações" e de religiões. É reconhecido tanto o papel negativo que as religiões desempenharam tradicionalmente nos conflitos, quanto o decisivo papel pacificador e curador que poderiam ter desempenhado se tivessem decidido assumir uma visão positiva e lúcida em relação à pluralidade. É sobre esta "visão" ou "teologia" pluralista, necessária para que as religiões se aliem em função do serviço à Humanidade e ao planeta, que queremos refletir. Não haverá paz no mundo, sem paz entre as religiões; e não haverá paz entre as religiões, sem uma visão teológica pluralista.
Nos últimos tempos, a sociedade humana se "mundializou", chegando, pela primeira vez, a um notável grau de unificação em nível planetário, abrangendo grande parte das grandes sociedades humanas. E cada sociedade local, por meio de um processo de multiplicação de comunicações e migrações, foi se interpenetrando com as demais, passando a ser sociedades internamente plurais, tanto em nível cultural como religioso. Nunca antes os seres humanos tiveram tanta possibilidade de conviver com diversidades culturais que até agora haviam vivido tradicionalmente isoladas, cada uma em seu âmbito. As sociedades tradicionalmente monoculturais e monorreligiosas desapareceram, irreversivelmente. Uma nova característica dominante das sociedades humanas atuais é a sua pluralidade cultural e religiosa.
Mas essa pluralidade não se deixa experimentar sem conflito. São conhecidas as agudas tensões interculturais que são vividas em várias partes do mundo, assim como o chamado "choque de civilizações", situação da qual só ultimamente nos conscientizamos em nível planetário, e da qual não se pode ignorar a dimensão religiosa. Os conflitos religiosos, as "guerras de religião" são de longa data em nossa história humana. Hoje, porém, a conflitividade intercultural e inter-religiosa não se dá só entre grandes blocos civilizacionais, mas também no interior da microconvivência social, nas cidades, nos bairros, nas comunidades, até nas famílias.
Por outro lado – e, talvez, em parte, como efeito dessa longa experiência histórica de conflitividade religiosa –, grandes segmentos da sociedade moderna abriram-se a uma nova consciência, de tipo pluralista, que desconfia da possibilidade de que uma cultura ou religião detenha valores únicos, absolutos, válidos e obrigatórios para toda a humanidade. Trata-se de uma nova mentalidade que opta, convencidamente, pela pluralidade, pela validade positiva mas relativa de todas as realizações culturais e religiosas da humanidade. Pode-se dizer que, de alguma forma, essa nova mentalidade já faz parte da consciência humana mundial, marcando uma tendência crescente e irreversível. É um novo sinal dos tempos, que põe fim a uma época da humanidade em que era possível que os povos concebessem a globalidade da realidade com base em seus próprios valores particulares, imaginados como sendo únicos, absolutos e universais.
As religiões vêm de um mundo singular e totalizante
Com efeito, as religiões que hoje conhecemos surgiram e se consolidaram naquela época pré-pluralista que afirmamos estar acabando. Surgiram em ambientes culturais diferentes e, apesar dos grandes viajantes, das correntes migratórias e dos influxos e intercâmbios que nunca deixaram de existir (e que explicam, de fato, que a maior parte das religiões são sincréticas, mesmo sem sabê-lo), durante muito tempo, milenarmente, viveram, de fato, isoladas, cobrindo, solitariamente, todo o seu mundo cultural regional. Elaboraram seu patrimônio simbólico a partir de um marco epistemológico, isto é, a partir de uma forma de conhecer que lhes permitia reconhecer à sua própria verdade local os valores de absoluticidade e unicidade, convertendo-a, assim, em uma Verdade universal, válida para todo o mundo e para todos os tempos. Algumas religiões se comprometeram mais com uma busca doutrinal e até dogmática, colocando, com frequência, o acento mais na "explicação" teórica do que na experiência espiritual. Outras se dirigiram preferencialmente pelos caminhos da experiência mística, mais tolerantemente e sem afãs dogmáticos. Embora a espiritualidade sempre tenha estado presente de formas muito diversas, conviria reavaliar sua presença e retomá-la como o eixo central da religião, para além das explicações teóricas dogmatizantes que sempre isolam, dividem e enfrentam.
No marco daquela epistemologia proveniente dos tempos do isolamento das religiões, as mais doutrinais se converteram em religiões totalizantes, em sistemas de pensamento que se constituíam como base única, total e indiscutível de conhecimento, e aos quais se devia – segundo a exigência oficial – adesão doutrinal cega e inquestionável. Porém, hoje, muitos seguidores dessas religiões e as próprias sociedades que as abraçam vivem instalados em um pensamento religiocêntrico, fora do qual não podem dialogar com outras verdades. Só a sua religião é "a Verdade" e, à margem dela, não podem reconhecer a existência de outras "verdades", no plural.
Historicamente, essa configuração epistemológica levou aos conflitos religiosos e culturais, tornando muito difícil o diálogo religioso e a adoção de uma consciência pluralista por parte das religiões e de seus membros mais abertos. Até hoje, não poucas religiões desconfiam da atual situação de pluralismo; temem o diálogo inter-religioso ou, no fundo, consideram-no impraticável, admitindo-o só de forma reduzida, como um diálogo intercultural útil para a convivência social, mas que não pode afetar em nada suas próprias convicções religiosas. Essas dificuldades não existem só entre religiões, mas também dentro delas, entre correntes, famílias espirituais e tendências ideológicas diferentes, entre maiorias e minorias… e influenciando em tudo isso as questões étnicas e culturais, as hegemonias políticas, os interesses econômicos…
Essas dificuldades afetam – em forma e grau diferentes – as principais religiões mundiais, e essa situação de conflitos e de falta de diálogo religioso em nível mundial repercute muito negativamente em autoisolamento, rivalidade, proselitismo e, sobretudo, em falta de cooperação para o Bem Comum da Humanidade e do planeta, o que, com certeza, nesta nova hora de emergência ecológica que atravessamos no início do século XXI, faz com que seja dramático ver forças vivas da Humanidade, como as religiões, abdicando, de fato, de seus principais deveres para com ela.
Para sair dessa situação, para se tornar capazes de dialogar e de juntar forças e missão a serviço da Humanidade e do planeta, as religiões precisam enfrentar esse problema epistemológico que as incapacita para dialogar e para assumir a consciência pluralista moderna. Enquanto não derem esse passo, não poderemos contar com as religiões como devem ser: fermento, animação, impulso e liderança em favor do progresso da consciência da humanidade.
Ampliando a perspectiva epistemológica das religiões
Nessa situação, os teólogos, as teólogas e muitas outras pessoas religiosas, que há tempo estão procurando ajudar a superar essas dificuldades, dialogando entre nós e, inclusive, dentro de nós mesmos, representam um papel singular de esperança. Como membros dessa sociedade atual, tornamos nossa, de um modo quase imperceptível, embora com esforço e trabalho, a sua consciência pluralista, fruto da perspectiva histórica acumulada ao longo dos tempos em suas experiências positivas e negativas em relação às religiões. Epistemologicamente, isto é, enquanto à forma de conhecer, muitas pessoas e comunidades já conseguiram se desprender do religiocentrismo espontâneo em que praticamente todos nós fomos configurados por nossas respectivas religiões. O mundo é amplo, e a história vem de muito longe, mas cada vez mais conhecemos melhor as religiões, seu surgimento, seus mecanismos de funcionamento, seu acesso e sua gestão da verdade (sua epistemologia), assim como as reconhecidas limitações de que podem padecer.
Esse conhecimento cada vez mais amplo das religiões nos permite colocar nossa própria religião em um contexto mais amplo e mais profundo: assim contempladas, vemos que as religiões são respostas diferentes ao Mistério, diante do qual se situa a existência humana, que palpita em cada coração humano e que impele para ser acolhido e venerado, expressado e cultivado. A quase infinita variedade de expressões religiosas (crenças, mitos, ritos, doutrinas, expressões místicas…) que a humanidade produziu ao longo de sua história e que nunca havíamos conhecido com tanta extensão e profundidade como hoje nos surpreende e, ao mesmo tempo, nos enche de um sentimento de aniquilamento, de reverência admirada e de pequenez humilde. É uma riqueza inestimável que herdamos, e toda ela pertence a todos os seres humanos, isto é, está à nossa disposição, sem limites. As religiões, passadas e presentes, todas elas, são patrimônio indivisível da Humanidade: são nossas, tuas, minhas, de toda pessoa que vem a este mundo e que tem direito de se enriquecer com a sua sabedoria ancestral e com os seus recursos morais e espirituais.
Nossa identidade religiosa, configurada pela religião em que fomos educados, fica assim demarcada e reforçada com essa ampliação do conhecimento religioso, que só a nossa geração pôde experimentar: nossos ancestrais até nossos avós nunca puderam experimentar a amplitude do conhecimento religioso que hoje desfrutamos. Somos felizes por poder conhecer e até saborear toda essa riqueza religiosa que configurou os seres humanos, seus povos e suas sociedades, elevando-os acima de si mesmos, até sua mais sublime realização.
Superamos o exclusivismo
Durante milênios, com mais ou menos radicalidade, a maior parte das religiões acreditou ser o centro do mundo, sua interpretação correta, a Verdade… frente à qual, em não poucos casos, se arrogavam o privilégio de ser, além disso, sua realização única, "exclusivamente nós".
Não podemos esquecer o fato evidente de que, durante muitas épocas da história, esse "exclusivismo" (esse pensamento de que "exclusivamente nós temos a verdade") serviu para nos justificar como salvadores dos demais povos, o que justificou imposições religiosas e, com elas, imposições também culturais, linguísticas, políticas, além de legitimação de conquistas, submissões, escravidão, avassalamento de culturas… A "visão" religiosa desses nossos ancestrais, sua visão ou teologia exclusivista, foi a responsável por aquelas condutas arrogantes, egocêntricas, depreciativas e opressoras em relação aos outros. E não foi um erro só de uma época, nem de uma corrente minoritária, nem foi uma opinião teológica lateral ou secundária, mas sim uma doutrina proclamada solenemente, de um modo contínuo no tempo e pela qual se cometeram verdadeiras atrocidades.
Embora, lamentavelmente, em não poucos lugares do mundo e ainda hoje continua essa visão se perpetue, somos muitos hoje os que vemos claramente que aquele exclusivismo religioso foi uma miragem, uma ilusão de ótica, uma forma de olhar equivocada. Assim lhes pareceu ver as religiões, sem fazer muitas análises sobre as influências de nossos interesses egoístas na gestação das nossas próprias visões teológicas… Hoje parecemos ver com clareza o caráter limitado, condicionado e, às vezes, subconscientemente mal-intencionado de nossas elaborações teóricas, inclusive no campo religioso. Isso faz com que nos autoexijamos uma maior vigilância crítica na elaboração da nossa visão teológica e uma vontade decidida de revisar, nesta altura da história, todas as doutrinas e visões que tragam consigo algumas dessas consequências negativas, porque uma árvore boa não pode produzir frutos ruins: se de uma visão teológica derivam consequências negativas ou imorais – como foi e é o caso do exclusivismo na história e no presente –, essa doutrina ou teologia deve ser reconsiderada e revista.
Uma visão pluralista das religiões
Reconhecemos que a causa principal que está provocando toda essa transformação do nosso modo de ver, de viver e de sentir a religião radica na própria transformação da sociedade humana, que ampliou seu conhecimento e que tem das religiões uma experiência muito mais ampla e muito diferente da que nossos antepassados tiveram. Estamos em outra época. O ser humano conhece de outro modo. Não podemos ser religiosos da mesma forma. Tivemos acesso a uma consciência planetária, que, por sua mundialização, rompe os etnocentrismos e evidencia como ilusórias as pretensões ou reivindicações particulares de privilégio, de superioridade ou de absoluticidade. Esse novo ser humano de hoje ao qual nos referimos só pode ser religioso sendo pluralista, embora muitas pessoas ainda continuem sendo religiosas com os parâmetros antigos e tradicionais.
Somos membros dessa sociedade nova, com essa epistemologia diferente, com essa cultura pluralista, e só podemos viver nossa religiosidade dentro dessa epistemologia. Nem nós, nem nossos contemporâneos mais conscientes – sobretudo os jovens – podemos pensar ou compartilhar uma visão teológica elaborada a partir de parâmetros ultrapassados que vão ficando obsoletos. Nossa experiência religiosa só pode se expressar dentro dos nossos modos de pensar, sobre a base da epistemologia atual – não de uma outra, já desaparecida – e dentro de nossa nova visão pluralista.
Hoje, parece-nos óbvio que, por principio, todas as religiões, como respostas humanas ao Mistério da existência, merecem uma avaliação positiva. Não, as religiões não são iguais, nem dizem a mesma coisa; são muito diferentes e dizem coisas muitos diversas; mas, globalmente, todas elas são maravilhas admiráveis que o Mistério suscitou com sua presença na densidade cultural concreta de cada um de nossos povos. Por principio, todas as religiões merecem o máximo respeito, a veneração estremecida diante do resplendor da Divindade que em cada uma delas se reflete. Todas elas são caminhos de verdade, instrumentos de Deus e, ao mesmo tempo, realizações humanas, cheias de inspiração e criatividade. Cremos, por principio, que devemos dar às demais religiões, às religiões dos outros, a mesma presunção de legitimidade, dignidade e sinceridade que reivindicamos para a nossa. Tudo isso, entretanto, não nega o realismo de que, como respostas humanas situadas em uma cultura e em condições concretas, as religiões também têm suas limitações e podem ser utilizadas para fins contraditórias com a sua própria natureza.
Mais ainda: não só outorgamos às religiões, de antemão, essa consideração e o respeito à sua dignidade, mas também à incredulidade, à falta de religião, às opções pluri-interespirituais, assim como à espiritualidade laica. São igualmente espirituais, dignas e legítimas, realizadoras e salvadoras da existência humana.
É uma visão pluralista, que aceita sinceramente e com todas as consequências, a biodiversidade religiosa, a "hierodiversidade" na qual, assim como na biodiversidade natural, nenhuma forma esgota a realidade nem detém o monopólio da Vida. Nenhuma religião, nenhuma posição religiosa ou opção espiritual detém o monopólio da relação do ser humano com o Absoluto; todas o buscam e, provavelmente, todas o encontram, a seu modo e medida, e nenhuma o esgota nem o monopoliza.
Em linguagem teísta, diríamos que Deus, o "Deus semper maior", é maior do que pensávamos… Nós o havíamos convertido em "nosso Deus", no Deus do nosso povo, da nossa raça, da nossa cultura, dos nossos interesses, da nossa verdade única… Hoje, primeiro com surpresa e depois com regozijo, descobrimos que não somos os únicos, nem só o único povo escolhido para salvar o restante da Humanidade… mas sim que todos os povos o são. Deus não abandonou nenhum povo, não faz acepção de pessoas, nem de povos, nem de culturas, nem deixou algum segmento da Humanidade em situação de grave deficiência de salvação… Assim, recuperamo-nos de um equívoco que nos fez cair em um complexo de superioridade, em uma visão infantil e imatura, que só hoje, a esta altura da história, podemos superar, com grande alegria.
Desafios do pluralismo para as religiões
Sabemos, porém, que não é fácil mudar de visão, realizar essa transformação de nossa mentalidade, adaptando-a à nova consciência planetária e pluralista de nossas sociedades contemporâneas. Muitas pessoas e segmentos inteiros da Humanidade permanecem na velha consciência ou mantêm dividido seu modo de conhecimento: pluralista e planetário para as realidades diárias, e tradicional e exclusivista com relação ao religioso. Por sua vez, as instituições religiosas, suas hierarquias e aqueles que trabalham com elas se sentem fortemente condicionados pelos interesses que toda instituição tem, como confirma a sociologia. A oficialidade religiosa não é um bom lugar para se refletir livre e sinceramente. Assim como provavelmente Jesus também quis dizer, "só a liberdade nos fará verdadeiros", ou seja: só quando nos livrarmos do medo à mudança, do temor ao novo, das amarras do obsoleto, dos interesses institucionais e até econômicos… só então poderemos reconhecer a verdade, a nossa e a alheia, toda a Verdade, a que a Humanidade, com esforço, tenta acessar pelos muitos caminhos de Deus… São os membros da base das diversas religiões, os pensadores livres, o povo fiel que devem pressionar e exigir de suas hierarquias essa transformação, organizando, autonomamente até se for necessário, o diálogo e a cooperação entre as religiões.
Também sabemos que uma certa "decepção" influi negativamente, que pode nos acompanhar ao abandonar a visão tradicional da qual viemos, em que fomos ensinados e que, durante muito tempo, pensamos sinceramente que nossa religião ocupava o centro do espectro religioso, assim como todo o campo, porque as demais religiões não passavam de sucedâneas ou participações da nossa. Para muitos, nas diversas religiões, pode parecer, em princípio, uma decepção o fato de passar a considerar a sua religião como uma religião particular, junto com o resto das religiões da história, forçada pelos fatos a conviver, a se entender e a colaborar com as demais… Porém, quem olhar com detida atenção e com olhos novos poderá descobrir uma nova visão da realidade, muito diferente, mais lógica, menos elitista, mais justa e fraterna. E isso não é decepcionante, mas entusiasmante.
O principal desafio radica na profunda transformação que muitos elementos fundamentais da nossa visão tradicional, que já não se encaixam na nova consciência planetária nem são mais inteligíveis em si mesmos, deverão experimentar. Como dissemos, as religiões formaram todo o seu patrimônio simbólico no tempo da epistemologia anterior e trazem essa marca em todas as suas elaborações: seus símbolos, seus mitos, seus ritos, sua teologia… Portanto, para se tornar apta a uma pessoa de fé em sintonia com a mentalidade planetária pluralista da nossa sociedade, a maior parte desses elementos deve ser reformulada, recriada até, dentro do marco do novo paradigma epistemológico pluralista. É preciso entender de um modo novo realidades como a revelação, a eleição, a missão, a salvação… e muitas outras. As religiões que oficialmente ainda estão instaladas no exclusivismo – ou em sua forma suave, no chamado "inclusivismo" – precisam se reler pluralisticamente, reelaborar sua autocompreensão a partir dessa nova perspectiva. E, somente quando tiverem realizado esta autotransformação interna, esse "intradiálogo" ou diálogo consigo mesmas, é que serão capazes de dialogar inter-religiosamente com as demais religiões, serão capazes de entender a si mesmas como religiões irmãs, chamadas a colaborar na mesma missão, não a sua missão, mas na "missio Dei", a missão que Deus mesmo gostaria de nos ver realizando em relação ao Cosmos e sua Humanidade.
Nossa nova "visão", incluindo nela o que tradicionalmente chamamos de "teologia", deverá ser uma visão ou teologia pluralista, em todos os seus aspectos e em todas as suas ramificações. É uma grande tarefa pendente, necessária para que a maior parte das nossas populações religiosas mudem de visão e possam adotar uma postura não exclusivista diante dos problemas da Humanidade e do planeta, diferente da posição tradicional, ainda atual, de rivalidade e de divisão. As religiões até agora, majoritariamente, dividiram e ainda dividem a humanidade. Precisamos de uma nova visão, pluralista, que faça com que as religiões unam a Humanidade ao invés de dividi-la, uma visão que realize o milagre de convertê-las em entusiastas colaboradoras da busca do Bem Comum Universal.
Como já dissemos, com o acesso a essa nova etapa planetária e pluralista, o ser humano mudou: é diferente, entende a si mesmo de outro modo, conhece e pensa de outra forma, e sua própria religiosidade ancestral mudou e continua se transformando: já não serão possíveis as religiões que não queiram se adaptar a essa transformação ou as que prefiram morrer na fidelidade à repetição dos seus princípios já superados, nem as que quiserem seguir impondo o tipo de religião que elas foram nos milênios passados. Só as que tiverem a humildade suficiente para aceitar as exigências dessa renúncia continuarão sendo úteis ao ser humano e sobreviverão.
No entanto, há lugares e regiões onde essas concepções pluralistas já estão fundamentalmente assimiladas, ao menos de um modo prático, e seus problemas se situam mais na perspectiva da laicidade pós-religiosa, na busca de colaboração não entre as religiões, mas sim entre todos os grupos e movimentos humanos, para além de sua religião, em uma perspectiva até pós-religiosa. É uma situação nova, que merece uma reflexão própria, à parte.
Comissão Teológica Internacional da EATWOTA tradução é de Moisés Sbardelotto
Fonte: IHU
Nenhum comentário:
Postar um comentário