A Pauta de Bento XVI à Igreja do Brasil
Um balanço das visitas Ad Limina
As visitas Ad Limina dos bispos brasileiros e os pronunciamentos do Papa Bento XVI são analisadas por Sérgio Ricardo Coutinho. Na opinião do professor, os pronunciamentos do papa aos bispos brasileiros ao longo do último ano permitem visualizar o “programa pastoral” para a Igreja no Brasil nos próximos anos.Sérgio Ricardo Coutinho é mestre em História pela UnB; professor de História da Igreja no Instituto São Boaventura em Brasília; professor de História da Igreja Antiga no Curso de especialização em História do Cristianismo Antigo na UnB; membro da Associação Brasileira de História das Religiões (ABHR) e, presidente do Centro de Estudos em História da Igreja na América Latina (Cehila-Brasil) e assessor nacional das CEBs no Brasil.
Eis o artigo.
Introdução
Antes de refletir sobre este assunto, vale à pena citar o renomado historiador da Igreja, o italiano Giuseppe Alberigo. Ele apresenta dois sentimentos contraditórios e que são perceptíveis dentro e fora da Igreja católica. De um lado, sempre é muito difundida a convicção que o aparato eclesiástico central, que age em torno do papa e da Cúria Romana, tem uma capacidade de controle e de hegemonia sobre a massa dos fiéis cada vez mais estreita e rígida, a tal ponto que qualquer tentativa e qualquer esperança de afirmar a pluralidade das Igrejas como comunhão de comunidades locais, especialmente visibilizada pelas Conferências Episcopais nacionais, estaria destinado ao fracasso.
Entretanto, por outro lado, assiste-se também a uma multiplicação bastante acelerada de grupos cristãos que, apesar das muitas e graves carências, tem o efeito de esvaziar qualquer esforço do aparato eclesiástico e de reatualizar a possibilidade de uma comunhão eclesial efetiva, que saia da ambígua e esvaziada dialética de símbolos e das imagens (n.1).
Nada melhor para perceber estes sentimentos quando analisamos as mensagens que o papa Bento XVI deixou à todo o episcopado brasileiro após as visitas Ad Limina Apostolorum, ou seja, quando os bispos foram se encontrar com o papa e rezar juntos diante dos túmulos dos apóstolos São Pedro e São Paulo em Roma. Nestas visitas o papa recebe os relatórios de atividades e oferece uma orientação em vista da unidade de toda a Igreja com o sumo pontífice.
Os quase 300 bispos brasileiros na ativa, representando 272 dioceses e organizados nos 17 Regionais da CNBB, estiveram pessoalmente com o papa e com outros representantes dos dicastérios romanos, durante o período que se estendeu de 07/09/2009 até o último dia 15/11/2010. O próprio papa reconheceu esta “feliz coincidência” das datas para os brasileiros: “Por uma feliz coincidência, na data do discurso que dirigi ao primeiro grupo de Bispos era a vossa Festa Nacional da Independência, enquanto o último discurso que hoje pronuncio tem lugar justamente no dia em que se recorda a proclamação da República no Brasil”. (cf. Discurso do papa Bento XVI aos bispos do Regional Centro-oeste)
Foram exatamente 13 discursos proferidos aos bispos brasileiros. Para facilitar este breve balanço foi possível organizar em 5 grandes eixos temáticos: Família, consciência moral e vida sacramental; Missão e Evangelização; Padres, seminaristas, religiosos(as) e leigos(as); Escolas católicas e Teologia da Libertação; Bispos e CNBB.
Nossa hipótese é que podemos visualizar aqui o “programa pastoral” para a Igreja no Brasil nos próximos anos.
O Matrimônio, a consciência do pecado e a Eucaristia
Durante a visita conjunta dos Regionais Nordeste 1 (Ceará) e Nordeste 4 (Piauí), o papa Bento XVI quis sinalizar para uma das principais evidências do que chama de “ditadura do relativismo”: a desagregação do modelo matrimonial e familiar cristão.
Enquanto que a Igreja compara a família humana com a vida da “família” da Santíssima Trindade – “unidade de vida na pluralidade de pessoas” – e que não se cansa de ensinar que a família tem o seu fundamento no matrimônio e no plano salvífico de Deus, a sociedade moderna e secularizada, marcada por uma consciência difusa, vive na incerteza mais profunda a tal respeito principalmente depois que esta mesma sociedade legalizou o divórcio. O que prevalece, como fundamento, ou é o simples sentimento ou a subjetividade individual. Isto explicaria a diminuição do número de matrimônios e o crescimento das “uniões de fato” e dos divórcios. Conseqüência imediata destes fatos: crianças privadas do apoio dos pais e abandonadas, expansão da desordem social.
A proposta de solução oferecida pelo papa: regresso à solidez da família cristã unida pelo sacramento do matrimônio – “O que Deus uniu o homem não separe” (Mc 10,9). Deste modo, apesar do esforço de compreensão por parte da Igreja aos muitos casos de casais cristãos que se separaram, “não existem casais de segunda união, como os há de primeira; aquela é uma situação irregular e perigosa, que é necessário resolver, na fidelidade a Cristo, encontrando com a ajuda de um sacerdote um caminho possível para pôr a salvo quantos nela estão implicados”.
Neste sentido, somente a busca pelo sacramento da reconciliação será possível restaurar estas situações. Foi este o tema tratado para os bispos do Leste 1 (Rio de Janeiro). Para Bento XVI “o núcleo da crise espiritual do nosso tempo” está no “obscurecimento da graça do perdão”, ou seja, a perda da consciência do pecado. Quando a sociedade não reconhece o sacramento da reconciliação como algo “real e eficaz, tende-se a libertar a pessoa da culpa, fazendo com que as condições para a sua possibilidade nunca se verifiquem”.
No entanto, lá no íntimo das pessoas “libertadas” sabem que isso não é verdade, pois “o pecado existe e que elas mesmas são pecadoras”. Por isso, é fundamental recuperar nas pessoas o sentimento de culpa “porque no ordenamento espiritual são necessários para a saúde da alma”. Assim, todos nós “precisamos do perdão, que constitui o cerne de toda a verdadeira reforma: refazendo a pessoa no seu íntimo, torna-se também o centro da renovação da comunidade”.
Fundamental neste processo, segundo Bento XVI, para que uma comunidade possa chegar a merecer o título de “comunidade humana”, esta deveria corresponder, tanto na sua organização como nos seus objetivos, “às aspirações fundamentais do ser humano”. Neste sentido, não seria exagero afirmar que “uma vida social autêntica tem início na consciência de cada um”. Esta, bem formada, leva a realizar o verdadeiro bem do homem, mas a Igreja ajudaria neste processo de formação, através de toda a vida cristã, ajudando-o a educar sua consciência.
Por isso, falando aos bispos do Regional Sul 1 (São Paulo), o papa faz um apelo veemente: “Venerados Irmãos, falai ao coração do vosso povo, acordai as consciências, reuni as vontades num mutirão contra a crescente violência e menosprezo do ser humano. Este, de dádiva de Deus acolhida na intimidade amorosa do matrimônio entre o homem e a mulher, passou a ser visto como mero produto humano” (n.2).
Somados a todos estes elementos, onde a sociedade secularizada não percebe mais a presença da graça de Deus e, até mesmo, recusa sua oferta, temos ainda a “desconfiança” quanto a presença real de Jesus Cristo na Eucaristia.
Falando para o bispos do Regional Norte 2 (Pará e Amapá), o papa afirma que o centro e a fonte permanente de seu ministério petrino estão na Eucaristia, “coração da vida cristã, fonte e vértice da missão evangelizadora da Igreja”. Por isso, os bispos compreenderão a preocupação que ele tem por tudo o que possa ofuscar o ponto mais original da fé católica: Jesus Cristo “vivo e realmente presente na hóstia e no cálice consagrados”.
Nova Evangelização e o “Brasil na Missão Continental”
Atento para as mudanças que em poucas décadas aconteceu no campo religioso brasileiro, caracterizado por uma diminuição drástica do número de católicos nominais e para um aumento dos grupos evangélicos pentecostais e dos assim chamados “sem-religião”, o papa Bento XVI, no dialogo com os bispos do Regional Nordeste 3 (Bahia e Sergipe), demonstra muita preocupação quanto ao processo de evangelização para conter a “sangria” de seus membros.
Apesar de reconhecer que a “ação evangelizadora da Igreja Católica foi e continua sendo fundamental na constituição da identidade do povo brasileiro”, hoje se observa uma crescente influência de “novos elementos na sociedade, que há algumas décadas eram-lhe praticamente alheios”. Um destes elementos seria o desejo de alguns grupos contrários a presença de símbolos religiosos na vida pública.
Para Bento XVI os símbolos religiosos têm um valor particular, especialmente para o Brasil, em que a religião católica é parte integral de sua história. Daí se pergunta: “Como não pensar neste momento na imagem de Jesus Cristo com os braços estendidos sobre a baía da Guanabara que representa a hospitalidade e o amor com que o Brasil soube abrir seus braços a homens e mulheres perseguidos e necessitados provenientes de todo o mundo?” (cf. discurso para os Bispos do regional Nordeste 5).
Os motivos para a “fuga de católicos” e sua adesão à outras denominações podem ser explicados pela “difundida sede de Deus” entre os brasileiros, como também revela uma evangelização por demais superficial. Por isso, a Igreja católica no Brasil necessita investir numa “nova evangelização”: “que não poupe esforços na busca de católicos afastados bem como daquelas pessoas que pouco ou nada conhecem sobre a mensagem evangélica, conduzindo-os a um encontro pessoal com Jesus Cristo, vivo e operante na sua Igreja”. Mas também chama a atenção dos bispos para a necessidade dos padres se compromissarem por “estabelecer pontes de contato através de um sadio diálogo ecumênico na verdade” com aqueles membros das mais diversas denominações cristãs.
Por outro lado, o papa, falando para os bispos do grande regional Norte 1 (Amazonas e Roraima) e Noroeste (parte do Amazonas, Acre e Rondônia), enfatiza que a ação missionária da Igreja não pode se limitar a “simples busca de novas técnicas e formas que tornem a Igreja mais atrativa e capaz de vencer a concorrência com outros grupos religiosos e ideologias relativistas”. Neste sentido, a missão não é um trabalho para a Igreja em si mesma, mas é a conseqüência natural da própria essência da Igreja, “um serviço do ministério da união que Cristo quis operar no seu corpo crucificado”.
Por isso, o esmorecimento do espírito missionário não deveria ser atribuído as limitações e carências nas formas externas da ação missionária tradicional, mas ao esquecimento de alimentar-se naquele núcleo mais profundo: a Eucaristia. Assim, “para que a Missão Continental seja realmente eficaz, esta deve partir da Eucaristia e conduzir para a Eucaristia”.
Aqui vale uma observação eclesiológica. Bento XVI concorda que a essência da Igreja é ser missionária, mas a “preocupação primária” deve ser a “salvação das almas, que é a missão fundamental da Igreja” (discurso para os bispos do Centro-oeste).
Padres, seminaristas, religiosos(as) e leigos(as)
Para os bispos dos regionais Oeste 1 e Oeste 2 (Mato Grosso e Mato Grosso do Sul), o papa Bento XVI relembra os anos que sucederam imediatamente ao Concílio Vaticano II e, principalmente, as suas consequências negativas para a Igreja: a abertura ao mundo foi entendida como uma passagem à secularização, vendo nela densos valores cristãos como igualdade, liberdade e solidariedade, com muita disponibilidade para descobrir campos de cooperação. No entanto, alguns responsáveis eclesiais, apesar de corresponderem às expectativas da opinião pública em debates éticos, deixaram de falar sobre as “verdades fundamentais da fé”: o pecado, a graça, a vida teologal, novíssimos. Acabaram por cair na “auto-secularização de muitas comunidades eclesiais”. O resultado foi que viram partir muitos daqueles que tinham, defraudados e desiludidos.
Hoje, uma nova geração, nascida neste “ambiente eclesial secularizado”, que se esperava deles mais abertura, vê na sociedade o abismo e os confrontos, sobretudo no campo ético, se intensificarem contra o Magistério da Igreja. Por isso, esta nova geração sente uma grande sede de transcendência diante deste “deserto de Deus”.
São justamente estes jovens, secularizados e sedentos, que batem à porta do Seminário. Estes precisam, segundo o papa, encontrar formadores que sejam verdadeiros homens de Deus, sacerdotes totalmente dedicados à formação e que testemunhem sua vocação através “do celibato e da vida austera”. Por isso, é tarefa dos bispos estabelecerem os critérios essenciais para a formação dos seminaristas e dos presbíteros “na fidelidade às normas universais da Igreja”.
Falando para os bispos do Regional Nordeste 2 (Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas), o papa desenvolve um tema que ele mesmo considera “um dos pontos mais delicados do ser e da vida da Igreja”: as relações entre sacerdócio comum e sacerdócio ministerial.
Chama a atenção para que aja um entendimento sobre a identidade específica dos ministros ordenados e dos leigos para que se evite “a secularização dos sacerdotes e a clericalização dos leigos”. A identidade própria dos leigos, segundo Bento XVI, é o seu empenho em “exprimir na realidade, inclusive através do empenho político, a visão antropológica cristã e a doutrina social da Igreja”. Já os padres “devem permanecer afastados de um engajamento pessoal na política, a fim de favorecerem a unidade e a comunhão de todos os fiéis”, para que sejam, por isso, uma referência para todos.
Segundo ele, este “desequilíbrio” poderia ser explicado pelo pouco número de presbíteros e que levariam as comunidades “a resignarem-se a esta carência” e se consolando com isso para poderem evidenciar melhor o papel dos leigos. Mas aí estaria o equívoco: “não é a falta de presbíteros que justifica uma participação mais ativa e numerosa dos leigos. Na realidade, quanto mais os fiéis leigos se tornam conscientes de suas responsabilidades na Igreja, tanto mais sobressaem a identidade específica e o papel insubstituível do sacerdote como pastor do conjunto da comunidade”. Por isso tudo, os bispos devem concentrar esforços para despertar novas vocações sacerdotais e encontrar os pastores indispensáveis aos trabalhos diocesanos.
Também indispensáveis para este trabalho conjunto com os bispos estão os membros das comunidades religiosas. Falando aos bispos do Regional Sul 2 (Paraná), Bento XVI exalta a importância das diversas famílias religiosas de vida monástica, congregações religiosas, sociedades de vida apostólica, instituto seculares até as novas formas de consagração, pois elas enriquecem a Igreja, “antes de tudo com o seu amor”, com os seus carismas e abre a Igreja diocesana “a uma dimensão mais universal”. “Por isso a vida consagrada nunca poderá faltar nem morrer na Igreja: foi querida pelo próprio Jesus como parcela irremovível da sua Igreja”.
Escola católica e Teologia da Libertação
Durante a visita conjunta dos Regionais Sul 3 (Rio Grande do Sul ) e Sul 4 (Santa Catarina), Bento XVI, no seu trabalho de lutar contra o relativismo e a sociedade secularizada, desenvolveu seu discurso em cima da questão da cultura, particularmente “para dois lugares clássicos onde a mesma se forma e comunica”: a universidade e a escola. Sua fala se fixou na ação desenvolvida por aquelas comunidades acadêmicas que nasceram “à sombra do humanismo cristão e nele se inspiram, honrando-se do nome ‘católicas’.
Defendeu junto aquele episcopado a escola católica e sua inserção junto às outras instituições educativas. Ela está a serviço da sociedade, pois desempenha uma função pública e um serviço público de utilidade, não só aos católicos, mas “aberto a todos os que queiram usufruir de uma proposta educativa qualificada”. Em outro discurso, para os bispos do Maranhão, afirmou assim sobre este mesmo tema: “Por isso, amados Irmãos, uno a minha voz à vossa num vivo apelo a favor da educação religiosa, e mais concretamente do ensino confessional e plural da religião, na escola pública do Estado”.
Além disso, aproveitou para agradecer, em nome de toda a Igreja, às diversas comunidades religiosas que fundaram e sustentam Universidades Católicas, mas lembra-lhes também que “estas não são uma propriedade de quem as fundou ou de quem as freqüenta, mas expressão da Igreja e do seu patrimônio de fé”.
Em função disso, ou seja, da Universidade católica como sendo o lugar de “expressão da Igreja e do seu patrimônio de fé”, o papa Bento XVI aproveitou para relembrar os 25 anos da Instrução Libertatis nuntius da Congregação da Doutrina da Fé, sobre alguns aspectos da Teologia da Libertação.
Segundo ele, ainda se fazem sentir as seqüelas desta corrente nas dioceses daqueles dois regionais. Seqüelas estas marcadas por rebeliões, divisões, dissensos, ofensas, anarquias, gerando ainda “grande sofrimento e grave perda de forças vivas”. Por isso, suplica “a quantos de algum modo se sentiram atraídos, envolvidos e atingidos no seu íntimo por certos princípios enganadores da teologia da libertação, que se confrontem novamente com a referida Instrução, acolhendo a luz benigna que a mesma oferece de mão estendida”.
CNBB e Bispos
Sobre o múnus pastoral dos bispos, o papa Bento XVI fez um discurso para o episcopado do Regional Leste 2 (Minas Gerais e Espírito Santo). Enquanto sucessores dos Apóstolos, e tomando parte do Colégio a partir da “sagração episcopal e pela comunhão hierárquica com a Cabeça e os membros”, são confiados aos bispos “a tríplice função de ensinar, santificar e governar o povo de Deus”. Fortificado internamente pelo Espírito Santo, cada bispo deve fazer-se “tudo para todos” (1 Cor 9, 22), propondo “a verdade da fé, celebrando os sacramentos da nossa santificação e testemunhando a caridade do Senhor”, e devendo ser sempre princípio e fundamento visível nas suas dioceses.
Por isso mesmo, os pastores têm “o grave dever de emitir juízo moral, mesmo em matérias políticas” quando os direitos fundamentais da pessoa “ou a salvação das almas” o exigir. Foi desta forma que o papa se posicionou para os bispos do Regional Nordeste 5 (Maranhão).
Para ele, seria totalmente falsa e ilusória qualquer defesa dos direitos humanos políticos, econômicos e sociais que não compreendesse a enérgica defesa do direito à vida desde a concepção até à morte natural. Assim, quando projetos políticos contemplam, aberta ou veladamente, a discriminalização do aborto ou da eutanásia, o ideal democrático é atraiçoado nas suas bases.
Daí conclama os bispos: “Portanto, caros Irmãos no episcopado, ao defender a vida não devemos temer a oposição e a impopularidade, recusando qualquer compromisso e ambigüidade que nos conformem com a mentalidade deste mundo” (n.3).
Finalmente, e encerrando as visitas Ad limina, falou para o episcopado do Regional Centro-Oeste (Distrito Federal, Goiás e Tocantins). Na verdade, este discurso foi mais uma orientação para toda a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), incluindo seus assessores(as).
Para o papa a CNBB continua sendo “um ponto de referência da sociedade brasileira. No entanto, o que se espera de seus membros é a prática “da caridade recíproca”. As Conferências Episcopais são o lugar concreto da “aplicação do afeto colegial dos Bispos em comunhão hierárquica com o Sucessor de Pedro, para ser um instrumento de comunhão afetiva e efetiva entre todos os membros, e de eficaz colaboração com o Pastor de cada Igreja particular na tríplice função de ensinar, santificar e governar as ovelhas do próprio rebanho”. Por isso, elas devem evitar de colocar-se como uma realidade paralela ou substitutiva do ministério de cada um dos Bispos.
Em seguida, elenca alguns temas relevantes para a atuação conjunta dos bispos: a promoção e a tutela da fé e da moral, a tradução dos livros litúrgicos, a promoção e formação das vocações de especial consagração, elaboração de subsídios para a catequese, o compromisso ecumênico, as relações com as autoridades civis, a defesa da vida humana, desde a concepção até a morte natural, a santidade da família e do matrimônio entre homem e mulher, o direito dos pais a educar seus filhos, a liberdade religiosa, os outros direitos humanos, a paz e a justiça social.
Por fim, faz uma advertência ao trabalho dos(as) assessores(as) da CNBB: “é necessário lembrar que os assessores e as estruturas da Conferência Episcopal existem para o serviço aos Bispos, não para substituí-los. Trata-se, em definitiva, de buscar que a Conferência Episcopal, com seus organismos, funcione sempre mais como órgão propulsor da solicitude pastoral dos Bispos” (n.4).
Conclusão
Retomando a citação inicial de Giuseppe Alberigo, precisaremos ainda acompanhar com que intensidade e com qual profundidade as “opções pastorais” do papa Bento XVI terão repercussão no próximo quadriênio de trabalho da nova presidência da CNBB (maio de 2012). Será que a CNBB terá forças para esvaziar o esforço centralizador do aparato eclesiástico e reatualizar “a possibilidade de uma comunhão eclesial efetiva”?
Notas:
1 - ALBERIGO, Guseppe. A Igreja na História, São Paulo: Paulinas, 1999, p.33.2 - Ao observar os eventos que sucederam durante as eleições presidenciais de 2010, parece que os bispos de São Paulo aceitaram o apelo do papa.3 - Este discurso foi feito alguns dias imediatamente próximos às eleições presidenciais em segundo turno e acabou por reforçar a posição assumida por alguns bispos do Regional Sul 1 e dos grupos de defesa da vida (pró-vida).4 - Aqui fica evidente a preocupação do papa Bento XVI com as possíveis fissuras, reveladas com muita intensidade, no interior da CNBB quando do desenvolvimento da campanha eleitoral presidencial deste ano. Outro ponto, que sempre volta aos debates internos da CNBB, é o problema “assessor”. As mudanças estatutárias empreendidas na CNBB, e aprovadas pela Santa Sé em 2002, tinham como uma de suas preocupações diminuir a influência dos(as) assessores(as) no planejamento e ação pastoral. Dom Luciano Medes de Almeida relembra este processo quando a CNBB comemorava seu jubileu de ouro: “Vejam, toda a parte de planejamento é útil, tudo o que sofremos para elaborar diretrizes, custou muito trabalho, mas nada disso chega perto da dedicação, por exemplo, dos assessores. Quanta gente sofreu quando não falaram bem dos assessores! Quem de nós não sabe que são pessoas que dedicaram a vida inteira, horas a fio, de madrugada, trabalhando, dando a vida pela Igreja no Brasil, correndo de lá para cá. Vocês sabem, isso custou muito mais a nós que estávamos na presidência, do que se tivessem falado de nós. Primeiro, porque eram grandes amigos. Sempre foram. Mereciam confiança. Agíamos com maior transparência. Eles não podiam, muitas vezes, se defender. Então foi, e ainda é, um momento difícil, que teve reflexos na nova legislação da CNBB”. (Cit. in INP (org.). Presença Pública da Igreja no Brasil: jubileu de ouro ‘da CNBB, São Paulo: Paulinas, 2002, p. 515).
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