Sempre tive admiração pelos educadores populares, aqueles que inseridos na comunidade, trabalham a cidadania, buscam a promoção do ser humano sem ter por trás um estatuto ou um regimento escolar com critérios de nota e avaliações. A ação da educação popular não se restringe à transmissão de conceitos desvinculados da realidade. Fato este que leva o educador a ter conhecimento dos problemas da comunidade em que trabalha.
Essa admiração começou no final na década de setenta, quando tive conhecimento do trabalho das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), nas quais as reflexões sobre os problemas comunitários abriam espaço para o trabalho educacional, proporcionando assim a organização de movimentos sociais. Geralmente as discussões partiam da leitura de um trecho da Bíblia. E dela, os esclarecimentos sobre direitos e deveres eram colocados em debates, favorecendo assim uma organização popular para que houvesse um direcionamento nas reivindicações para o bem da coletividade.
O livro “Pedagogia do Oprimido” de Paulo Freire, publicado em 1974, passou a ser leitura obrigatória para todo educador popular, principalmente para quem trabalhava com alfabetização de jovens e adultos. E ele define assim essa diretriz pedagógica:
“A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e libertadora, terá dois momentos distintos. O primeiro, em que os oprimidos vão desvelando o mundo da opressão e vão comprometendo-se na práxis, com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a realidade opressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia dos homens em processo de permanente libertação”.
A professora Maria Francisca de Pinho Valle que, no sábado (31/03) tomou posse da cadeira 39, patronímica de Tobias Barreto, na Academia Petropolitana de Educação (APE), em um ensaio publicado na revista “Poema Pedagógico” no nº 06, afirmou: “O fato do educador e educando serem sujeitos da prática educativa não anula a especificidade de cada um. Porém, o caráter democrático da educação popular deve ser demonstrado na prática de educar na democracia. O que não é fácil! Não há processo educativo sem diretividade. Isto não significa que esta seja autoritária por parte do sujeito educador. Se falharmos na ‘prática de pensar a prática’, facilmente caímos no populismo pedagógico. Talvez seja esta a causa da falta de continuidade de muitas experiências em educação popular.”
Essa educadora, que sucedeu o saudoso professor Antônio Cláudio Gomes na APE, e que atualmente coordena o Projeto “Paiol de Histórias” da Fundação Cultural Casa Lygia Bojunga, fez uma afirmativa bastante contundente no ensaio já citado: “Não adianta pensar que vou ser mais democrática me escondendo sob o adjetivo ‘popular’. Minha capacidade de respeitar e amar as diferenças, reconhecendo que todos podem ser importantes no processo de transformação social, deve exemplificar muito mais o que é democracia.”
Na quinta feira-santa (05/04), tive a graça de conhecer, em Lorena, o Padre Dílson Passos Junior que me fez conhecer o excelente o trabalho realizado com os jovens nos oratórios, criados principalmente em comunidade com baixo poder aquisitivo.
Através de atividades recreativas, em torno de um campo de futebol, de uma quadra, de uma mesa de ping-pong, sem distinção de credo, raça, os jovens são acolhidos. E a partir desses encontros identificam-se os líderes. E estes ficam na incumbência de convidar outros jovens. Eu não sabia que esse trabalho teve início em 1841, por Dom Bosco, fundador da Ordem Selesiana.
“Mal entrei no Colégio de São Francisco, vi-me logo cercado por um bando de meninos que me acompanhavam em ruas e praças, até mesmo na sacristia da igreja do instituto. Não podia, entretanto, cuidar deles diretamente por falta de local. Um feliz encontro proporcionou-me a oportunidade de tentar a concretização de um projeto em favor dos meninos que erravam pelas ruas da cidade, sobretudo dos que deixavam as prisões.
No dia solene da Imaculada Conceição e Maria, 8 de dezembro de 1841, estava, à hora marcada, vestindo-me com os sagrados paramentos para celebrar a Santa Missa, o sacristão José Comotti, vendo um rapazinho a um canto, convidou-o a ajudar-me a Missa.” ( Essa citação foi retirada do livro “Memórias do Oratório de São Francisco de Sales, escrito por São João Bosco).
Hoje só o oratório coordenado pelo Padre Dílson, em Lorena, acolhe uma média de duzentos jovens. Entre acólitos e coroinhas são cinquenta, participam dessas atividades recreativas, vários jovens com liberdade assistida.
Concordo com o simpaticíssimo padre Mário, que também conheci em Lorena, que em torno de uma igreja ou de uma escola é possível desenvolver um trabalho comunitário tendo em vista o bem comum.
Ataualpa A. P. Filho
Educador
Fonte: Tribuna de Petropolis - 12/04
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