OUÇAMOS OS CLAMORES da CARTA e da Elaine!
Belo Horizonte, 26 de fevereiro de 2011
Prezados bispos Dom Walmor Oliveira e Dom Joaquim Mol, nossos pastores, tudo bem com vocês? Espero que sim. Que o Deus da vida continue abençoando vocês. Infelizmente nós das comunidades Camilo Torres e Irmã Dorothy, aqui no Barreiro, em Belo Horizonte, não estamos nada bem. Afinal estamos prestes a perder nossos lares e ir para rua com nossas crianças.
No último dia 16 de fevereiro de 2011, data inclusive que a Comunidade Camilo
Torres completou seu terceiro aniversário, tivemos uma reunião no 5o Batalhão de Polícia a respeito do despejo. A reunião foi convocada pelo coronel Carvalho, comandante das polícias especializadas (tropa de choque), com diversas autoridades religiosas, judiciais, municipais e representantes das comunidades, para uma suposta negociação. Uso essa expressão, Dom Walmor e Dom Joaquim, porque participei da reunião e ouvi claramente o Oficial de Justiça dizer que o despejo deve ser feito em caráter de urgência, com uso de força policial. Disse que já conseguiu transporte e galpões para nossos pertences. Fiquei congelada ao ouvir isso.
Prezados Dom Walmor e Dom Joaquim, é de entrar em estado de pânico. Onde colocaremos nossas crianças? Essa pergunta martela na minha cabeça o tempo todo.
O desespero tem tomado conta não só de nós adultos, mas dominado nossas crianças que mais uma vez se vêem nessa situação. Andam tristes, deprimidas e adoecendo. Nas escolas, elas expressam seus sentimentos em desenhos que mostram a chegada da polícia com tratores, casas sendo derrubadas, seus pais e elas ensangüentadas. Infelizmente, Dom Walmor e Dom Joaquim, será muito pesado ver. Ai a mim! Pergunto-me o que fazer, pois até minha filha de três anos se assusta quando vê polícia e tratores, perguntando se é para derrubar nossa casa.
O médico do Posto de Saúde diz que a causa das doenças que vêm tomando conta dos moradores das comunidades Camilo Torres e Irmã Dorothy se chama despejo. Afinal os moradores andam tensos e nervosos o tempo todo. Todos dizem que não abrirão mão do direito de morar e viver com dignidade. Sabemos que é melhor morrer lutando do que sobreviver humilhado. Sem alternativa digna, resistiremos. Não nos resta outra opção.
Estou assustada e com medo dessa ação desumana que pode ocorrer a qualquer momento. Eles se preocuparam com nossos fogões e camas, mas nas nossas crianças eles não querem nem saber. Realmente o desespero é um péssimo conselheiro. Cadê o nosso direito à paz? Cadê o nosso direito de viver em paz?
Dom Walmor e Dom Joaquim, fico tentando prever qual será nossa reação ao ver nossa dignidade ser pisoteada simplesmente porque nossos governantes se negam a ouvir o clamor dos pobres pedindo que se faça valer o direito constitucional à moradia. Não nos negamos, Dom Walmor e Dom Joaquim, a sair do terreno, mas desde que tenhamos casa digna para morarmos com nossos filhos.
Caros Dom Walmor e Dom Joaquim, diante dessa situação desesperadora, venho clamar que os senhores nos ajudem a sermos ouvidos e que nossos gritos de misericórdia cheguem aos ouvidos daqueles que possam impedir essa tragédia anunciada, um massacre. Dom Walmor e Dom Joaquim, vocês visitaram nossas comunidades (Dandara, Camilo Torres e Irmã Dorothy), também Dom Aloísio, e vocês puderam ver que se trata de mães em sua maioria e pais de família que investiram não só em tijolos, mas que vivem verdadeiramente o amor ao próximo, algo que sabemos que se esfriou em muitos locais. Clamamos aos senhores que gritem conosco por misericórdia. Sei que a voz de nossos pastores, junto com a nossa, acenderá uma luz no fundo do túnel, pois neste momento, Dom Walmor e Dom Joaquim, apenas o abismo está presente. É claro que nossa fé está voltada à justiça de Deus e acreditamos que a justiça reinará.
Termino esta carta recordando que somos 277 famílias clamando por misericórdia a Deus e às autoridades. Na Dandara estão outras 887 famílias que também clamam por justiça e pelo direito à moradia.
Aos senhores, Dom Walmor e Dom Joaquim, reafirmo que a voz de vocês nos ajudará a impedir que essa cidade seja manchada com sangue de nós trabalhadoras que lutamos todos os dias para garantir um teto que cubra a cabeça de nossos filhos.
Um grande abraço e que Deus abençõe os senhores cada vez mais. Somos eternamente gratas pelo apoio e solidariedade que temos recebido da igreja.
"Dá ouvido SENHOR às minhas palavras e acode ao meu gemido!” (salmos 5)
Elaine Andrade
Rua 16 de fevereiro, 3
Comunidade Camilo Torres,
Barreiro
Belo Horizonte, MG, Brasil.
Fonte: Adital
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